A leitura é sempre um universo paralelo e fascinante, para aqueles e aquelas que tem este hábito. Uma indicação para os aficionados por ficção científica é o clássico Neuromancer, de William Gibson. Parte da narrativa deste livro foi fonte de inspiração para a produção Matrix, sucesso nas telas de cinema.
Vale a pena a leitura deste livro que chega aos 30 anos de seu lançamento. Visões de tecnologias de um futuro que se materializou e de tantas outras (quem sabe) que ainda estão por vir....
Sonhos cibernéticos
‘Neuromancer’, romance que legitimou o cyberpunk, completa
30 anos. As histórias desse subgênero da ficção científica se passam em
futuro distópico com ênfase em alta tecnologia e degradação social.
Por: Fred Furtado Publicado em 17/04/2013
No mundo imaginado por William Gibson, a fronteira entre
real e virtual é imprecisa. Os usuários de computadores na megacidade
criada por ele vivem uma “alucinação consensual coletiva”. (imagem:
Wikimedia Commons)
Um mundo onde as corporações multinacionais têm grande poder e
controlam um volume substancial da sua vida; onde a computação e a
internet estão em todos os lugares, sendo usados até para fins
militares; onde as cidades se expandiram tanto até se fundirem; e onde a
interface entre homem e máquina está avançando.
Pode parecer uma descrição do mundo atual ou mesmo de alguns anos à frente, mas na verdade é o futuro representado no romance Neuromancer, do escritor norte-americano William Gibson.
Escrito em 1983 (mas publicado em 1984), o livro transformou esse cenário num elemento integral do subgênero que legitimou, o cyberpunk.
Tecnologias de informação e cibernética mescladas à desintegração na
ordem social são alguns dos elementos que caracterizam esse estilo.
A história, num tempo futuro não identificado, mas supostamente não tão distante da atualidade, acompanha o caubói Case. Em Neuromancer, caubóis não são os vaqueiros do Velho Oeste – eles se assemelham mais aos nossos hackers. São pessoas que ganham a vida invadindo computadores e roubando informação.
Por meio de dispositivos inteligentes, os decks, os caubóis
navegam a “alucinação consensual” da matriz, uma versão muito mais
sofisticada da internet que é projetada em 3D na mente do caubóis e de
todos que interagem com ela. Quando conectada a ela, o usuário se
encontra no ciberespaço, termo cunhado pelo próprio Gibson e que hoje
integra o meio da computação.
Junto com o inescrutável Armitage, a perigosa Molly e o psicótico
Peter Riviera, Case é contratado pelo misterioso Wintermute para uma
missão que o fará sair de Chiba City, no Japão, passar por Istambul
(Turquia) e pelo Sprawl, megacidade que cobre boa parte da costa leste
dos Estados Unidos, até chegar às estações espaciais que orbitam a
Terra.
Tudo isso num clima noir e envolvendo elementos de contracultura, computação e cibernética, também descrito em inglês como high tech, low life; em português, algo como ‘alta tecnologia, vida baixa’.
Marco um
Segundo o professor de jogos digitais da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), o escritor de ficção científica Fábio
Fernandes, Neuromancer não é considerado o marco zero do cyberpunk.
“Esse título é dado ao romance City come a-walkin, do
escritor norte-americano John Shirley, de 1980. Mas a obra de Gibson é
brilhante e tem seu diferencial no excesso de estilo, nas imagens que
cria e no seu olho para o detalhe, entre outros aspectos”, observa.
“É preciso lembrar que ele já tinha 35 anos quando escreveu Neuromancer
– não era um escritor inexperiente, apesar de ser seu primeiro
romance,” acrescenta Fernandes, que traduziu a obra para o português
(editora Aleph).
Entre as inspirações de Gibson, o escritor brasileiro destaca a pop art,
especialmente a de temática espacial dos anos 70; a cultura japonesa; o
nascente mundo da informática; e o movimento de contracultura.
“Esteticamente, há semelhanças com o filme Blade Runner, mas Gibson as nega. Diz que entrou no cinema para ver o filme, mas saiu no meio para não se influenciar”, conta Fernandes.
Previsões
Volta e meia, obras de ficção científica são julgadas pela sua
capacidade de previsão do futuro. Embora essa não seja considerada uma
métrica válida para escritores e críticos, fãs do gênero gostam de
discutir como esse ou aquele livro acertou em prever o desenvolvimento
de um determinado tipo de tecnologia.
Não poderia ser diferente com Neuromancer. Mas Gibson é o
primeiro a refutar o título de profeta. Ele argumenta que se realmente
fosse presciente, teria pensado no telefone celular, um dispositivo cuja
ausência na história de Case e seus comparsas é, hoje em dia,
extremamente chamativa.
Outro elemento que não se concretizou foi a supremacia cultural do Japão. Na década de lançamento de Neuromancer,
apostava-se que o futuro seria dominado por influências nipônicas, mais
ou menos como atualmente se acredita que será o caso com a cultura
chinesa.
Finalmente, em determinado momento da narrativa, Case se refere a 3 megabytes
(MB) de memória RAM como um item “quente”. Embora o ‘calor’ da memória
tenha mais a ver com o conteúdo guardado nela, é risível pensar que no
futuro megabytes ainda terão alguma relevância, já que nós, no presente, estamos trabalhando com gigabytes (GB) e terabytes (TB), volumes mil e um milhão de vezes maiores que MB.
Ocaso
Um detalhe curioso da obra é o número acima da média de referências
ao Brasil, desde drogas sintéticas a instalações de inteligência
artificial. Para Fernandes, a presença do país no texto não tem
significado mais profundo e estaria lá porque Gibson precisava de um
lugar que parecesse exótico. “Na época, o Brasil era um lugar violento
associado ao tráfico de drogas”, lembra o escritor.
Apesar de seu sucesso nos anos 1980, o cyberpunk hoje está
praticamente extinto como gênero literário. Seus escritores mais
emblemáticos se dedicam a uma ficção científica que não mais se enquadra
nos padrões do subgênero que deu origem a Neuromancer.
“É um pós-cyberpunk. Na verdade, houve uma abertura de escopo das histórias, inclusive com visitas ao passado. Um dos filhos do cyberpunk é o steampunk, cujas histórias se passam numa era Vitoriana com tecnologias que nunca existiram”, conta Fernandes.
Fred FurtadoCiência Hoje/RJ
Fonte: http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/sobrecultura/2013/04/sonhos-ciberneticos
Muito bom prof!!
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