Metamorfoses Históricas: História, livros, músicas, cinema e motos!

Metamorfoses Históricas: História, livros, músicas, cinema e motos!



1ª Série - IFC

Um espaço dedicado a novidades no campo da história para os alunos e alunas das 1ª séries do Instituto Federal Catarinense - campus Sombrio (Sede e Unidade Urbana)

Vírus gigante do passado

Em sua coluna de março, Alexander Kellner fala da descoberta recente de um vírus em solos congelados da Sibéria. O feito indica a possibilidade de detecção de agentes patológicos ‘extintos’ capazes de afetar a saúde humana.
Por: Alexander Kellner                                                     Publicado em 18/03/2014
Vírus gigante do passado
‘Pithovirus sibericum’, vírus de grande porte encontrado no solo siberiano. Testes de laboratório mostraram seu poder de infectar uma cultura da ameba ‘Acanthamoeba castellanii’. (imagem: Julia Bartoli e Chantal Abergel/ IGS/ CNRS/ AMU)

Degelo em franco progresso, liberando agentes patogênicos que causam epidemias... Soa familiar? Certamente o leitor já ouviu falar desse tema, já explorado por roteiristas de cinema. Mas será que essa possibilidade, por mais remota que seja, é verossímil?

A discussão é revigorada com a recente publicação, na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), da descoberta de um vírus gigante, que estava ‘hibernando’ há pelo menos 30 mil anos no permafrost da Sibéria.

E o que é mais desconcertante: experimentos em laboratório demonstraram que o vírus, que tem DNA como material genético, pode se tornar ativo, matando amebas em algumas horas. O estudo foi liderado por Matthieu Legendre, da Universidade de Aix-Marseille, na França.

Megaviridae, Pandoravirus

Vírus são estruturas relativamente simples não consideradas organismos. Trata-se de agentes infecciosos, parasitas por natureza, que só conseguem se replicar dentro de células vivas de um organismo. Podem infectar animais, plantas e até mesmo bactérias.

Ao contrário do que ocorre com as células, não aumentam de tamanho e tampouco conseguem se dividir. Por serem pequenos, com diâmetro que varia na maioria das vezes de 20 a 300 nanômetros (1 nm = 1 bilionésimo de metro), só podem ser vistos com o auxílio de microscópios eletrônicos. Seu genoma é formado por uma ou mais moléculas de ácido nucleico (DNA ou RNA).

Em 2003, foi descoberta uma nova categoria de vírus, que diferem dos demais sobretudo por seu tamanho avantajado, podendo ser vistos ao microscópio óptico. A comunidade científica mostrou grande interesse no seu estudo, que veio revelar a existência de outros, procedentes de áreas geográficas e ambientes distintos. Esses vírus gigantes foram reconhecidos como pertencentes a um novo grupo, chamado Megaviridae.

Todos têm uma estrutura geral similar. São formados por uma camada externa fibrosa única e medem cerca de 0,7 micrômetro. Têm um genoma de 1,25 Mb – 1 Mb (megapares de base) corresponde a 1.000.000 bp (do inglês, base pair) –, codificam 1.000 proteínas e se replicam dentro da célula sem envolver o núcleo.

Posteriormente foi detectado outro grupo de vírus gigantes, designado Pandoravirus. Estes possuem virions (partículas virais) maiores – com 1 a 1,2 micrômetros e em forma de ânfora –, podendo conter um genoma de até 2,8 Mb e codificando até 2.500 proteínas. Sua replicação, ao contrário do grupo anterior, envolve o núcleo da célula hospedeira. Sabe-se que ambos os grupos infectam a ameba Acanthamoeba.

A equipe de Matthieu Legendre decidiu estudar o potencial das camadas de permafrostda Sibéria para preservar microrganismos, e também vírus. As camadas de permafrostapresentam algumas particularidades favoráveis à preservação de microrganismos, como pH neutro e escassez de oxigênio.

Permafrost
‘Permafrost’ no ponto mais setentrional do Ártico. Suas camadas de gelo apresentam características favoráveis à preservação de microrganismos, como escassez de oxigênio e pH neutro. (foto: Brocken Inaglory/ Wikimedia Commons – CC BY-SA 3.0)
Tomando cuidado para evitar contaminação, os pesquisadores realizaram seus estudos em amostras congeladas coletadas em 2000 na região de Chukotka, às margens do rio Anui. Segundo datações, essas camadas se formaram há pelo menos 30 mil anos (Pleistoceno tardio).

No início, as amostras revelaram a presença de estruturas semelhantes a vírus. Após isolá-las e realizar os procedimentos padrão relativos a amplificação, os pesquisadores examinaram o material ao microscópio eletrônico e verificaram que se tratava de um novo vírus, gigante, batizado de Pithovirus sibericum.
Sua morfologia geral assemelha-se ao grupo dos Pandoravirus, mas se diferencia por ser maior (1,5 micrômetros de comprimento e 500 nanômetros de diâmetro) e apresentar na parte superior uma estrutura hexagonal. Curiosamente, depois de sequenciado, descobriu-se que o genoma do vírus siberiano era menor, compreendendo apenas 600 kb – 1 kb (kilo pares de base) corresponde a 1.000 bp.
Para verificar sua possibilidade de infectar organismos, os pesquisadores colocaram o novo vírus em contato com uma cultura de Acanthamoeba castellanii. Verificaram então que o vírus continuava ativo, infectando essa ameba em um período de 10 a 20 horas.
A estratégia de replicação também era distinta da dos Pandoravirus e semelhante à dos Megaviridae, por não envolver o núcleo da célula. Ou seja, o novo vírus siberiano possui características dos dois grupos e algumas próprias, demonstrando que pertence a um terceiro grupo de vírus gigantes. 


Consequências

O estudo do Pithovirus apresenta várias implicações, algumas interessantes e outras preocupantes. Por um lado, a descoberta mostra que sabemos pouco sobre esses vírus gigantes, que parecem bem mais diversificados do que se supunha até agora.
Como esses agentes infecciosos fazem parte dos vírus DNA (assim chamados por conter DNA como material genético), o fato de se encontrar um deles com possibilidade de ainda estar ativo confirma a hipótese de que o DNA pode se manter por um período de tempo geológico extenso.
Já haviam sido encontradas evidências de que vírus e seus hospedeiros podem se manter preservados em rochas por longo tempo, como o Coccolithovirus e seu hospedeiro, revelados a partir de dados genéticos preservados em sedimentos de 7.000 anos na base do mar Negro.
Mais antigo ainda é o registro do tomato mosaic tobamovirus, obtido em testemunhos de gelo da Groenlândia, cuja idade varia de 500 a 140 mil anos. No entanto, essa é a primeira vez que se comprova a viabilidade de um vírus tão antigo.
Seria então possível um dia um vírus ‘extinto’ – gigante ou não – com potencial de afetar animais, inclusive a nossa espécie, acabar reaparecendo? No momento, os cientistas não têm uma resposta segura, já que as condições para infectar a ameba peloPithovirus foram estabelecidas em laboratório e não na natureza.
Degelo no Alasca
Comparação de fotos do Alasca mostra que a geleira McCarty, com cerca de 20 km, visível em 1909, não aparece na imagem de 2004. O aquecimento global em áreas circumpolares pode expor vírus no meio ambiente. (imagens: Ulysses Sherman Grant/ USGS Photo Library, 1909 e Bruce F. Molnia/ USGS, 2004)

Mas a pergunta é válida, uma vez que o degelo do permafrost na Sibéria e em outras áreas é contínuo, liberando no meio ambiente microrganismos distintos de tudo o que conhecemos e que há muito tempo desapareceram da face da Terra.

De qualquer forma, o estudo de Matthieu e colegas confirma a noção de que o aquecimento global e o desenvolvimento industrial em áreas circumpolares podem levar à exposição de vírus em distintos ecossistemas. Até mesmo a perfuração de camadas congeladas antigas para prospecção de petróleo no Ártico, por exemplo, pode trazer à superfície vírus preservados há milhares de anos.


Alexander Kellner  - Museu Nacional/UFRJ -  Academia Brasileira de Ciências


_____________________________________________________________________________________
Caminhos pré-colombianos


O povoamento do continente americano foi multiétnico e descontínuo. Há divergência a respeito das rotas migratórias percorridas por diversos grupos étnicos que habitaram estas terras desde o fim da Era Glacial

Glaucia Malerba Sene                                                                10/05/2013

Há pelo menos 12 mil anos, os primeiros hominídeos chegaram às Américas, caminhando lentamente, em pequenos grupos e por diferentes caminhos. Estas migrações foram multiétnicas e descontínuas. Hoje, já se sabe que os habitantes pré-colombianos deste continente percorreram ao menos quatro levas migratórias: três passando pelo Estreito de Bering (em épocas distintas) com chegada ao Alasca – e, em uma delas – posterior migração para Patagônia e sul do Chile. E pelo menos uma (ainda mais antiga) que teria vindo pelo Oceano Atlântico da Europa, cujo destino foi o sudeste dos Estados Unidos. Mas a trajetória até a aceitação científica das múltiplas origens dos nossos ancestrais foi longa e tortuosa.  
Durante as primeiras décadas do século XX, por exemplo, estudiosos norte-americanos apostaram suas fichas na existência de apenas um modelo preponderante de migração para este continente, que consistia na vinda de grupos de caçadores de animais de grande porte da Sibéria em direção ao Alasca.  Os ancestrais dos atuais esquimós teriam chegado ao continente em três levas – entre 12 e 6 mil anos atrás, durante o último período glacial. A teoria chamada “Clovis First”, no entanto, deixava algumas brechas na pré-História. Dúvidas que só começaram a ser respondidas em 1975, com a análise do fóssil brasileiro Luzia, pelo bioarqueólogo da Universidade de São Paulo, Walter Neves.
Movimentos migratórios antigos na América
O crânio da “paleoíndia” veio à tona pela antropóloga física Marília Alvim, após escavações nos sítio da Lapa Vermelha, em Minas Gerais. E logo se tornou ferramenta fundamental neste processo de mudança de paradigmas acerca das rotas migratórias, já que Luzia possui traço negroide, bem diferente do mongoloide - predominante nos ancestrais da América do Norte -, conforme indicou a pesquisa de Walter Neves. Sua teoria se tornou ainda mais clara após ter sido feita sua reconstituição facial.
Antes destes estudos se concluírem, no entanto, a arqueóloga francesa Annete Laming-Emperaire, responsável pela Missão Francesa no Brasil, já havia confirmado presença humana na mesma região mineira com datações variando entre 11 e 7 mil anos de idade.  E, cem anos antes, o naturalista dinamarquês Peter Lund já havia feito as primeiras descobertas da arqueologia brasileira na região de Lagoa Santa, Minas Gerais, sem saber que contribuiria para alimentar a posterior reviravolta nas diásporas migratórias americanas. Na época de Lund, ou seja, final do século XIX, foram encontrados dezenas de sítios arqueológicos em cavernas da região e centenas de esqueletos, muitos dos quais conduzidos à Europa, especialmente à Dinamarca para serem estudados por especialistas.
Nos últimos anos, outros registros arqueológicos com características semelhantes foram identificados também em Santana do Riacho, Minas Gerais e Caatinga de Moura, Bahia, no Brasil, além de achados nos Estados Unidos, no México, no Chile, na Colômbia e na Argentina.  Walter Neves coletou todas estas informações e publicou o resultado de sua pesquisa, indicando a possibilidade da existências de migrações americanas entre 20 e 25 mil anos atrás.
Outros casos
Na região de Monte Verde, no sul do Chile, escavações e estudos arqueológicos também realizados na década de 1970 indicaram que grupos caçadores-coletores haviam passado por ali há pelo menos 12.500 anos. A informação inviabilizava a teoria clássica migratória via Estreito de Bering para esta região, através do interior do continente americano. Ou seja, os “paleoíndios” daquela região do Chile teriam vindo também do norte do continente, mas via costa do Pacífico sem ultrapassar os limites da cordilheira. Surge, então, mais uma possibilidade migratória: o deslocamento via costa do Pacífico, que explicaria perfeitamente a rápida chegada à América do Sul, especificamente em Monte Verde, justificando ainda outras datações antigas encontradas na Patagônia e sul do Brasil.
Outras descobertas, como de sítios arqueológicos no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, também figuram o quadro de achados antigos do Brasil. Os vestígios de paleoíndios na região datam algo em torno de 50 mil anos atrás. Tais resultados levaram os pesquisadores envolvidos a sugerirem a chegada do homem ao local por meio de migrações via oceano Atlântico, cujos grupos, provenientes da África, teriam vindo em pequenas embarcações, em meio às inúmeras ilhas que afloravam na travessia, em função da oscilação do nível do mar. Esta hipótese migratória ainda encontra resistência no meio científico internacional.
Mas o caminho via oceano Atlântico para outras regiões da América chega a ser cogitado em outros casos, como o dos “paleoíndios” que se assentaram no sudeste dos Estados Unidos, provavelmente entre 25 e 17 mil anos atrás. Desde 1998, os pesquisadores Dennis Stanford e Bruce Bradley, da universidade britânica do Exeter, vem defendendo a vinda de grupos da Europa para a costa leste norte-americana, à bordo de pequenas embarcações. Foram encontrados sítios arqueológicos nos estados de Maryland, Pennsylvania, Virgínia, Florida e Delaware que apresentam vestígios de cultura material semelhante aos encontrados em escavações no Velho Continente.
Walter Neves em foto do acervo do Laboratório de Estudos evolutivos Humanos (IB/USP)
Walter Neves em foto do acervo do Laboratório de Estudos evolutivos Humanos (IB/USP)
Sambaquis e tupiguaranis
As migrações sempre foram necessárias entre os grupos de caçadores-coletores.  No Brasil, não poderia ser diferente, os deslocamentos persistiram ao longo do tempo, ganhando força por volta de 6 mil até o início da era cristã, quando grupos interioranos seguiram em direção ao litoral, em razão do aumento da temperatura e da maior disponibilidade de alimentos na costa, dando origem aos conhecidos sambaquis. Pouco se sabe dos percursos escolhidos para estas migrações. Há indícios de contatos com outras populações, especialmente no sul do Brasil, dada a monumentalidade e diversidade dos artefatos encontrados nessa faixa litorânea. As datações mais antigas estão no Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Paraná, entre 7.500 e 6.000 anos.
Coincidentemente, no mesmo período em que os sambaquieiros entravam em colapso, tinha início mais um novo ciclo de migrações, desta vez de grupos horticultores, vindos da Amazônia, detentores de uma organização social mais consistente e uma produção material tecnologicamente mais complexa. Englobados na tradição tupiguarani no último quartel do século XX, não representam uma unidade étnica, social e cultural, tendo sido recentemente denominados na arqueologia brasileira por “grupos portadores de cerâmica tupi-guarani”.
Há pelo menos três grandes propostas para a migração dos grupos tupi-guarani. Uma delas indica a existência de movimentos migratórios advindos da Amazônia Central – ou via rio Amazonas em direção à foz - e de lá teria seguido pelo litoral até São Paulo, compondo o ramo Tupinambá. A segunda indica a origem aos Guarani pelos afluentes dos rios Madeira e Guaporé, se disseminando pela bacia dos rios Paraná e Paraguai no sul do Brasil. A terceira e mais distinta, tem como ponto de dispersão a mesma região amazônica: os grupos Tupi, migrando unicamente pelo Brasil central, atingido o litoral na região sudeste, possivelmente através do Vale do Paranapanema. Neste ponto, uma parte teria seguido o rumo norte e outra, sul, dando origem aos Tupinambá e Guarani.
Se os pontos de partida e chegada dos grupos caçadores-coletores, sambaquieiros e horticultores já estão claramente identificados, seus verdadeiros itinerários ainda são obscuros. Os rastros dos caminhos milenares percorridos por estes povos foram sendo apagados pelo tempo e a pesquisa arqueológica tenta refazê-los pouco a pouco, dia após dia.
Glaucia Malerba Sene é professora colaboradora do Programa de Pós-graduação em Arqueologia do Museu Nacional (UFRJ) e autora da tese Indicadores de gênero na pré-história brasileira: contexto funerário, simbolismo e diferenciação social. O caso da Gruta do Gentio II, Unaí, Minas Gerais (USP, 2008).


_______________________________________________


 Outra história 
 

Grupo ‘reconta’ processo de ocupação pré-colonial da encosta catarinense e mostra que a região tinha densidade populacional considerável na pré-história

Por: Jársom Frank
 
Publicado em 25/01/2010 | Atualizado em 03/02/2010
 
Escavação em um dos sítios arqueológicos do município catarinense de Rio Fortuna, onde foram identificados locais de antigas fogueiras (foto: Grupep-Arqueologia / Unisul). 
 
Ao contrário do que supunha a arqueologia brasileira, os caçadores-coletores da Tradição Umbu não foram os únicos habitantes das áreas de encosta na região de Tubarão (SC) – entre a planície litorânea e o planalto – no período pré-colonial.  O mapeamento de mais de 200 sítios e a análise de quase 40 mil peças, feitos pelo Grupo de Pesquisa em Educação Patrimonial e Arqueologia, da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), mostrou que a região abrigou diferentes culturas.

Segundo a arqueóloga Deisi Scunderlick, coordenadora do grupo que percorreu uma grande extensão de terras durante dois anos, habitaram a região grupos pré-ceramistas (caçadores-coletores da Tradição Umbu) e ceramistas (Tupi-Guarani e Jê, tronco linguístico que deu origem aos Kaingang e Xokleng).

“O material lítico coletado remete à Tradição Umbu, mas os assentamentos escavados indicam grupos mais estáveis, possivelmente os Jê, que chegaram à encosta muito depois dos caçadores-coletores da Tradição Umbu”, diz Scunderlick. Isso confirma o que ela supunha desde que começou a decifrar os caminhos do homem pré-colonial pela mata atlântica, tema de sua tese de doutorado, defendida em 2005 na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, sob orientação do arqueólogo Pedro Ignácio Schmitz (ver ‘Linha do tempo’).

Ao levar adiante suas pesquisas na região, Scunderlick começou a pôr em dúvida o que era dado como certo até então: que a encosta era apenas um local de transição para os povos que circulavam entre o litoral e a serra. “Essas pesquisas não esclareceram aspectos cronológicos e culturais, uma vez que não escavamos nem datamos nenhum dos sítios mapeados”, ressalta a pesquisadora.

Agora, porém, depois de mapear quase toda a região, analisar sítios e peças já catalogados e descobrir novos sítios, ela sustenta que as áreas mapeadas são parte de uma grande teia de assentamentos espalhados entre o litoral e o planalto catarinense. “Em coletas de superfície e escavações pontuais, observamos um grande complexo de aldeias, com vários conjuntos de estruturas habitacionais, cerimoniais e laborais, todas providas de vestígios arqueológicos.”

Para dar ideia da densidade populacional da região na pré-história, Scunderlick estima que, em 15 sítios identificados em uma área de apenas 4 km2 no município de Rio Fortuna, por exemplo, cada um com cinco ou seis manchas de ocupação humana, viviam aproximadamente 1.500 pessoas. Hoje, a população de Rio Fortuna não vai além de 4.500 habitantes.

A grande quantidade de material lítico encontrado nas coletas de superfície corrobora a tese de que a densidade populacional da região era elevada no período pré-colonial. Quase 20 mil peças já haviam sido catalogadas em trabalhos anteriores e outras 20 mil foram encontradas pela equipe de Scunderlick ou por habitantes da região que trabalham na terra. Todo esse material foi analisado pelo grupo da Unisul. 

Jársom Frank
Especial para Ciência Hoje/SC                    Texto publicado na CH 266 (dezembro/2009)


Fonte:http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/revista-ch-2009/266/outra-historia/?searchterm=pr%C3%A9-hist%C3%B3ria  
______________________________________________________

Paleontologia com o pé direito
A descoberta de parte do pé de um possível ancestral humano que viveu há 3,4 milhões de anos pode ajudar a esclarecer o momento em que os hominídeos se tornaram bípedes. O primata ainda se locomovia subindo em árvores, mas também seria capaz de caminhar sem apoio.
Por: Mariana Rocha
Publicado em 30/03/2012 | Atualizado em 30/03/2012
Paleontologia com o pé direito
Os traços de oito ossos do pé direito de um hominídeo encontrado na Etiópia apontam que ele era capaz de andar sobre os dois pés, embora se locomovesse escalando árvores. (foto: The Cleveland Museum of Natural History, cortesia de Yohannes Haile-Selassie)
Pesquisadores dos Estados Unidos e da Etiópia encontraram evidências de um possível ancestral humano que viveu há 3,4 milhões de anos e, diferentemente de outros hominídeos da mesma época, ainda escalava árvores para se locomover. A descoberta de parte do pé direito desse primata, que também exibia características semelhantes às dos pés do homem moderno, pode ajudar a esclarecer em que momento ocorreu a transição para o andar bípede.
Os fósseis foram encontrados em um sítio arqueológico em Woranso-Mille, na região de Afar, na Etiópia. Os oito ossos coletados formam os dedos e parte do peito do pé direito de um primata. A comparação de aspectos morfológicos do material – como peso e tamanho – com os de ossos de espécies de gorilas, de macacos do Velho Mundo e do próprio homem moderno mostra que se tratava de um hominídeo. Os fósseis coletados exibem traços tanto de primatas bípedes quanto dos que usam os membros anteriores como apoio para caminhar.
Os pesquisadores ressaltam que o pé encontrado não pertence ao Australopithecus afarensis, espécie que viveu no mesmo período e apresentava andar bípede. Ao comparar o fóssil com a ossada de Lucy, exemplar de australopitecos coletado na mesma região em 1974, os cientistas identificaram importantes diferenças anatômicas que indicam como o hominídeo se deslocava pelo ambiente.
Sítio arqueológico na Etiópia
Os ossos do pé do hominídeo foram encontrados em um sítio arqueológico na região de Afar, na Etiópia, onde, em 1974, foi coletada uma ossada de um exemplar de ‘Australopithecus afarensis’ batizado de Lucy. (foto: The Cleveland Museum of Natural History, cortesia de Yohannes Haile-Selassie)
Assim como a espécie humana moderna, Lucy exibia os cinco dedos dos pés alinhados e uniformes. Já o pé encontrado apresenta um dedo que atua da mesma forma que o polegar opositor da mão humana. Esse mesmo dedo é visto nos pés de primatas como o gorila e é denominado opositor por permitir que o animal realize movimentos de pinça, o que facilita a subida e o deslocamento entre as árvores.
Por outro lado, foram encontrados metatarsos (ossos responsáveis por formar o dorso do pé) semelhantes aos do homem moderno. O achado indica que, apesar de desengonçado, o hominídeo encontrado também era capaz de manter um caminhar bípede.

Evolução do caminhar

O estudo, publicado esta semana na revista Nature, pode influenciar a maneira como os cientistas traçam a evolução do andar humano. Pela primeira vez, hominídeos que escalavam árvores foram descritos vivendo junto a outros hominídeos que se locomoviam apenas em terra – no caso, os Australopithecus afarensis – em uma mesma região e em um mesmo período.
A anatomia dos ossos sugere que se trata de uma espécie nova
Beverly Saylor, geóloga da Universidade Case Western Reserve e coautora do estudo, explica que o ambiente favorecia os hábitos dos dois primatas. “A presença de fósseis de peixes, crocodilos e tartarugas, além das características físicas e químicas dos sedimentos, mostra que a região formava um mosaico natural e permitia diferentes modos de locomoção”, diz em entrevista coletiva disponibilizada pela Nature.
O material encontrado é considerado raro, pois ossos dos pés geralmente são frágeis e não resistem à deterioração que ocorre com o passar do tempo. Como foi achada apenas parte do pé do hominídeo, é difícil imaginar como era sua aparência. Mas, segundo os pesquisadores, a anatomia dos ossos sugere que se trata de uma espécie nova.
O antropólogo e coordenador da pesquisa, Bruce Latimer, da Universidade Case Western Reserve, destacou, em entrevista coletiva, sua surpresa ao coletar o material. “Já estudei muitos fósseis do mesmo período e nenhum se parece com o que encontramos. Ainda é preciso buscar novas pistas, mas apostamos na descoberta de uma nova espécie.”

Mariana Rocha
Ciência Hoje On-line

Fonte: http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2012/03/paleontologia-com-o-pe-direito
________________________________________________________________________________
Evolução humana também pode ter ocorrido fora da África
Dente encontrado na Bulgária pode fazer com que os cientistas revejam a origem geográfica da evolução humana
por Anderson Estevan - 13/01/2012Fonte: NATIONAL GEOGRAPHIC BRASIL ONLINE http://viajeaqui.abril.com.br/materias/evolucao-humana-tambem-pode-ter-ocorrido-fora-da-africa-afirmam-cientistas


Dentes de ancestrais humanosDentes com mais de sete milhões de anos podem fazer com que os cientistas revejam a teoria de que os ancestrais dos seres humanos evoluíram na África e então partiram para conquistar o mundo. Pelo menos é o que acreditam os pesquisadores da Universidade de Tübigen, na Alemanha, que propõem que partes significativas da evolução humana podem ter ocorrido na Europa e Ásia Ocidental.

De acordo com o estudo, que foi publicado nesta semana pelo Journal of Human Evolution, a evolução humana também pode ter ocorrido em grande parte do território europeu. A nova teoria ganhou sustentação após a descoberta de dentes de pré-humanos encontrados em escavações em uma pedreira de areia em Azmaka, na Bulgária, e que datam 7 milhões anos – dois milhões depois do que se pensava que estes primatas haviam morrido na Europa.
Antes desta descoberta, o hominídeo “mais jovem” encontrado na Europa foi um fóssil de um macedonensis Ouranopithecus com 9,2 milhões de idade, encontrado na Grécia e que levou os cientistas a acreditar que os grandes símios da região haviam desaparecido há nove milhões de anos, por conta de mudanças bruscas no clima europeu, que causaram uma queda acentuada nos níveis de frutas, fonte primária da dieta dos grandes macacos na época.
Porém, análises nos dentes recém-descobertos apresentaram resquícios de nozes, gramíneas e sementes, ao invés de frutas, na superfície mastigatória do dente, indicando que o nosso ancestral já apresentava uma evoluída dieta europeia composta de alimentos mais duros e abrasivos. Este comportamento alimentar é semelhante a de hominídeos africanos, que só desapareceram há quatro milhões de anos.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Novo capítulo da pré-história americana  
Artefatos encontrados em sítio arqueológico no Texas (EUA) confirmam suspeitas recentes de que as Américas foram povoadas muito antes do que se pensava. Cerca de 2,5 mil anos separam o velho do novo “começo” da história do continente.

Por: Carolina Drago
Publicado em 25/03/2011 | Atualizado em 25/03/2011

Descobertas arqueológicas recentes estão prestes a reescrever um capítulo da pré-história das Américas. Um rico conjunto de artefatos encontrado no Texas foi datado por pesquisadores dos Estados Unidos como pertencente a um período de 15 mil anos e meio atrás. O achado contraria o modelo corrente, segundo o qual os primeiros grupos humanos a povoarem o continente teriam chegado aqui há cerca de 13 mil anos.

Esse modelo já vinha sendo colocado em xeque por arqueólogos depois que escavações na América do Norte revelaram artefatos mais antigos que 13 mil anos. Nesses sítios, no entanto, a quantidade de objetos encontrados era muito pequena para servir de evidência.
Essa descoberta implica no fim do modelo de que a cultura Clóvis teria sido a primeira a chegar aqui

Já no sítio arqueológico do Texas, a história foi outra: os quase 16 mil artefatos escavados comprovam que há 15,5 mil anos houve uma civilização que antecedeu a cultura Clóvis – como é conhecido o grupo até hoje considerado o primeiro a povoar as Américas.

“Essa descoberta implica no fim do modelo de que a cultura Clóvis teria sido a primeira a chegar aqui e na necessidade de desenvolver um novo modelo para o povoamento das Américas”, avalia Michael Waters, do Departamento de Antropologia e Geografia da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, e autor principal do artigo publicado hoje (25/3) na revista Science.

Kit portátil

Os pesquisadores descreveram os 15.528 artefatos encontrados no complexo Buttermilk Creeck – próximo a Austin, capital do Texas –, no sítio arqueológico Debra L. Friedkin. Destes, 56 foram identificados como ferramentas e os demais, como resíduos do processo de lascamento da pedra para a fabricação dos instrumentos.

Os artefatos encontrados foram feitos de sílex, uma variedade do quartzo. Seus formatos variam de lâminas a bifaces, ferramentas de base quadrada ou arredondada que afinam na parte superior.

“Alguns artefatos bifaciais indicam que o grupo estava fazendo pontas de projéteis e facas”, avalia Waters, em comunicado à imprensa. “Nós encontramos ainda ferramentas e lâminas usadas para o corte e raspagem.”

A maneira como os instrumentos da era pré-Clovis foram construídos assemelha-se à usada pela cultura Clóvis. Segundo os pesquisadores, isso mostra que a tecnologia mais antiga foi provavelmente adaptada – e aperfeiçoada – por esse segundo povo.

“Uma das principais diferenças entre as ferramentas dos dois períodos é o tamanho. Os artefatos pré-Clóvis são menores”, afirma Waters. A equipe sugere que eles teriam sido projetados como um conjunto de ferramentas portátil – algo que poderia ser facilmente empacotado e transferido de um lugar para outro.

“Nas camadas arqueológicas correspondentes ao período pré-Clóvis, também encontramos muitos objetos quebrados, que provavelmente foram usados para trabalhar osso e madeira”, complementa o pesquisador.

Os artefatos foram datados com o auxílio de uma técnica óptica que mede a quantidade de energia luminosa contida nos grãos de minerais como o quartzo. Com essa informação, indica a última vez em que estiveram expostos ao sol. No caso dessas ferramentas, a datação indicou 15 mil anos e meio atrás.

Registros no sul

Waters explica que, de fato, a cultura Clóvis não poderia ter sido a primeira a povoar as Américas. Isso porque, 13 mil anos atrás, quando se pensava que o povoamento no continente havia começado, a América do Sul já abrigava outra cultura.

Há 13 mil anos, a América do Sul já abrigava outra cultura

“Objetos desse período foram identificados em pelo menos seis sítios arqueológicos na América do Sul e, nesses lugares, não havia tecnologia alguma da civilização Clóvis”, destaca o autor.

Para ele e sua equipe, a civilização pré-Clóvis teria vindo do Nordeste da Ásia para o Novo Mundo, há 15 mil anos e meio, de barco. “As pessoas teriam atravessado o Estreito de Bering pelo mar, já que o corredor de gelo estava fechado nesse período. Essa é a única forma lógica pela qual elas podem ter viajado até os Estados Unidos”, conclui.

Carolina Drago
Ciência Hoje On-line

Fonte: http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2011/03/novo-capitulo-da-pre-historia-americana
------------------------------------------------------------------------------

Fora da África mais cedo

Estudo recente sugere que humanos saíram do continente africano 60 mil anos antes do que se pensava, seguindo uma rota diferente da traçada por pesquisas anteriores.

Publicado em 31/03/2011 | Atualizado em 31/03/2011

A maioria das evidências aponta que os humanos modernos deixaram a África pelo mar Mediterrâneo ou pela costa arábica há 60 mil anos. Agora, achados prometem dobrar essa cifra temporal.

Machadinhas, raspadores e perfuradores. Esse é o conjunto de peças com as quais a equipe de Hans-Peter Uerpmann, da Universidade Eberhard Karls (Alemanha), quer dobrar a idade da saída dos humanos modernos, que surgiram há cerca de 200 mil anos no continente africano.

Os objetos – cuja idade varia de 100 mil a 125 mil anos – foram achados no sítio arqueológico em Jebel Faya, nos Emirados Árabes Unidos.

Para os autores do estudo – publicado em janeiro na Science –, as peças são semelhantes àquelas feitas com base em técnica usada por humanos ainda mais primitivos do leste africano. Portanto, argumentam eles, não foi preciso a presença de inovação tecnológica para os humanos saírem da África. 

Estreito mais estreito

Com base nos achados, os humanos teriam saído da África não pelo norte do continente, seguindo o mar Mediterrâneo, mas por um caminho mais ao sul, atravessando o estreito de Bab al-Mandab, que separa o continente da península arábica.

Nessa jornada, o clima deu lá sua ajuda. Segundo os pesquisadores, por volta de 130 mil anos, Bab al-Mandab era mais seco – e, portanto, mais estreito –, por causa da flutuação do nível dos mares na época. A península arábica era também mais úmida que hoje, com maior cobertura vegetal e a presença de uma rede intricada de rios e lagos, em função de mudanças climáticas. 

Humanos teriam saído da África não pelo norte do continente, mas por um caminho mais ao sul, atravessando o estreito de Bab al-Mandab

Essas alterações do clima, segundo os autores, ocorreram por causa do chamado último período interglacial, época em que a temperatura média da Terra era mais alta do que a de hoje.

Ao chegar à península arábica, os humanos modernos teriam se dirigido ao chamado Crescente Fértil (no caso, região formada pelas bacias do rio Tigre e Eufrates). A partir daí, haveria mais ou menos um consenso sobre as rotas: eles teriam se dirigido à Europa e à Índia, de onde a migração se dividiu em dois braços, um seguindo para Oceania e Austrália, e outro para o estreito de Bering, a partir do qual chegaram à América do Norte e desceram para a Central e do Sul.



Cássio Leite Vieira - Ciência Hoje/ RJ
Texto originalmente publicado na CH 279 (março de 2011).

Fonte:http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/2011/279/fora-da-africa-mais-cedo