Metamorfoses Históricas: História, livros, músicas, cinema e motos!

Metamorfoses Históricas: História, livros, músicas, cinema e motos!



quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O rádio e as mudanças dos sentidos

Para os mais jovens este artigo mostra um pouco das formas de divulgação de noticias e outras "cositas" mais em tempos em que a imagem não valia, ainda, por mil palavras. O rádio e as transmissões sonoras eram a forma que as pessoas tinham de "ver" o mundo nas primeiras décadas do século XX. Mudanças de sentidos com as mudanças das tecnologias.

Um mundo sem televisão e internet, para muitos impossível frente as possibilidades existentes, mas que existe muitos interiores do Brasil ainda que o rádio faz a ponte com as novidades e notícias.  Vivemos numa mesma época, mas em tempos muitos diferentes!

O rei, o discurso e o rádio

Motivada pelo filme ‘O discurso do rei’, que se passa em uma época em que o rádio ocupava papel de destaque na sociedade, Keila Grinberg conta a história desse que foi o maior fenômeno de comunicação da primeira metade do século 20.

Por: Keila Grinberg                               Publicado em 15/02/2011 | Atualizado em Feb 15, 2011

(foto: George W. Ackerman/ Governo Federal dos Estados Unidos)

Que ninguém se engane: o personagem principal de O discurso do rei, um dos filmes favoritos a ganhar várias estatuetas do Oscar de 2011, não é o príncipe Albert Frederick Arthur George (interpretado por Colin Firth, candidato ao prêmio de melhor ator), que assume a contragosto o trono do império britânico e torna-se o rei George VI.

Muito menos o quase excêntrico terapeuta da fala Lionel Logue (interpretado por Geoffrey Rush, também sério candidato a levar a estatueta, na categoria de melhor ator coadjuvante), que tem a tarefa de ajudar o novo rei a superar o nervosismo e a gagueira durante seus discursos.
O grande personagem do filme é o rádio. Afinal, é só porque o príncipe precisa falar em público – e para todo o império britânico – que a necessidade de tratar sua gagueira é tão premente.
Em torno do rádio se passam as principais cenas do filme: da leitura do discurso – depois apropriadamente fotografado, como se ele tivesse sido feito no escritório de trabalho do rei – a sua transmissão e difusão para todo o império britânico.

Em seu primeiro discurso de guerra, por exemplo, proferido em 3 de setembro de 1939, dois dias depois de as tropas alemãs invadirem a Polônia e darem o pontapé inicial para a Segunda Guerra Mundial, George VI disse que queria falar a seus súditos como se estivesse entrando na casa deles.

Ouça abaixo a transmissão original do discurso



E era isso mesmo. Quem quer que falasse no rádio entrava na casa das pessoas, convivia com elas como se de fato as conhecesse. O rádio ocupava o espaço nobre das salas de estar, e o horário das notícias e dos programas transformava a vida das pessoas, pois ditava a própria organização do cotidiano familiar.

A era de ouro

Como bem disse o historiador britânico Eric Hobsbawm (1917-), o rádio “trazia o mundo à sua sala”. Ninguém jantava ouvindo rádio ou conversava ouvindo rádio – e a música que se ouvia jamais era “de fundo”, como hoje em dia. Hoje ouvimos rádio enquanto fazemos alguma outra coisa: dirigimos, cozinhamos, trabalhamos. Mas, na chamada ‘era do rádio’, isso jamais acontecia.
 
Assim como ocorreu com o avião, há quem advogue que o inventor do rádio foi um brasileiro
De fato, o rádio foi o maior fenômeno de comunicação da primeira metade do século 20, e ele ainda continua ocupando lugar de destaque entre os meios de comunicação, embora quem nasceu depois do advento da internet possa duvidar disso. Pois é: a primeira tecnologia wireless (sem fios) não foi criada para os computadores, mas para a propagação de ondas eletromagnéticas, as ‘ondas do rádio’.

Aliás, assim como ocorreu com o avião, há quem advogue que o inventor do rádio foi um brasileiro. Um ano antes de o físico italiano Guglielmo Marconi (1874-1937) se tornar mundialmente conhecido como o inventor do primeiro transmissor de ondas eletromagnéticas, o padre brasileiro Roberto Landell de Moura (1861-1928) fez, em 1894, uma demonstração de transmissão de ruídos da avenida Paulista ao alto de Santana, em São Paulo.

Por conta dessa e de outras façanhas, Landell de Moura foi reconhecido em 1904 como o inventor do telégrafo sem fio, do telefone sem fio e do transmissor de ondas sonoras.
Seja como for, a primeira radiodifusão aconteceu mesmo em 1916, em Nova Iorque (Estados Unidos). Com a invenção do microfone, já nos anos 1920, estavam criadas as condições técnicas para que o rádio deixasse de ser um aparelho utilizado apenas para fins militares e ganhasse o mundo.
Para liberar as sobras dos aparelhos fabricados durante a Primeira Guerra Mundial, a companhia norte-americana Westinghouse Electric Co instalou uma grande antena em sua fábrica e começou a transmitir música para seus vizinhos. Daí a começar a vender os aparelhos de rádio encalhados, foi um pulo.

Surgia então o primeiro meio de comunicação digno do título ‘de massa’, responsável pela criação de mais de 300 emissoras nos Estados Unidos no espaço de pouco mais de um ano.

Transmissão radiofônica no Brasil

No Brasil, a primeira transmissão radiofônica oficial foi o discurso do presidente Epitácio Pessoa (1865-1942), para comemorar o centenário da independência do país, em 1922. O discurso foi proferido na Praia Vermelha, mas o transmissor foi instalado no alto do Corcovado, pela mesma Westinghouse Electric Co.

A década de 1930 viu surgir as primeiras grandes rádios brasileiras – como a Rádio Nacional, a Rádio Bandeirantes e a Rádio Globo –, e com elas os programas governamentais, como A Hora do Brasil (hoje Voz do Brasil). No programa, as notícias oficiais eram veiculadas e o presidente Getúlio Vargas (1882-1954) dirigia-se diretamente a cada um dos brasileiros, assim como fez o rei George VI e como já faziam, na mesma época, o presidente norte-americano Franklin Roosevelt (1881-1945) e o ditador alemão Adolf Hitler (1889-1945).
Seguindo essa mesma linha de apresentação, em 1941 foi lançado o Repórter Esso, primeiro e mais importante jornal brasileiro transmitido por rádio, que durou até 1968. O bordão “a Segunda Guerra acabou depois que o Repórter Esso noticiou” evidencia bem a dimensão da credibilidade e da importância que o programa tinha no Brasil.
Mas nenhum outro episódio foi tão representativo da importância alcançada pelo rádio como a transmissão da simulação de um ataque marciano aos Estados Unidos feita pelo cineasta norte-americano Orson Welles (1915-1985) em 1938. Era para ser apenas uma peça de audioteatro, mas a transmissão pela Rádio CBS do drama na véspera do dia das bruxas deu à peça ares de realidade.

Welles adaptou o livro A Guerra dos Mundos, lançado em 1898 pelo escritor britânico H.G. Wells (1866-1946), para a linguagem radiofônica, como se fosse uma cobertura jornalística verdadeira (ouça a versão original em inglês).

O resultado foi quase inacreditável: em pânico, muitas pessoas acreditaram que os marcianos tinham mesmo invadido os Estados Unidos. Orson Welles passou o resto da vida tendo que se defender das acusações de ter deliberadamente espalhado terror pelo rádio.

Quem dera o rei George VI também pudesse ter sido acusado de pregar uma peça na população por ter anunciado, em 1939, que “dias terríveis” estavam a caminho.

Keila Grinberg
Departamento de História
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

EUA seguem o seu velho e surrado manual com os protestos no Egito

A situação de protestos no Egito entrou o mês de fevereiro a dentro e pelo que percebe-se não irá retroceder até as mudanças acontecerem. Com certeza é uma revolução que se desenrola na país e na região.

Como muita coisa circula pelas mídias, com as mais diferentes versões e opiniões, esta entrevista com o professor Noam Chomsky, critico ferrenho das políticas estadunidenses, trás a tona o mais do mesmo, ou seja, mostra como não há mudança na forma como os EUA encaram e tentam manter seu domínio no mundo.


Chomsky: EUA estão seguindo seu manual no Egito

Em entrevista a Amy Goodman, do Democracy Now, Noam Chomsky analisa o desenrolar dos protestos no Egito e o comportamento do governo dos Estados Unidos diante deles.

Nas últimas semanas, os levantes populares ocorridos no mundo árabe provocaram a destituição do ditador Zine El Abidine Bem Ali, o iminente fim do regime do presidente egípcio Hosni Mubarak, a nomeação de um novo governo na Jordânia e a promessa do ditador de tantos anos do Yemen de abandonar o cargo ao final de seu mandato.

O Democracy Now falou com o professor do MIT, Noam Chomsky, acerca do que isso significa para o futuro do Oriente Médio e da política externa dos EUA na região. Indagado sobre os recentes comentários do presidente Obama sobre Mubarak, Chomsky disse: “Obama foi muito cuidadoso para não dizer nada; está fazendo o que os líderes estadunidenses fazem habitualmente quando um de seus ditadores favoritos têm problemas, tentam apoiá-lo até o final. Se a situação chega a um ponto insustentável, mudam de lado”.

Amy Goodman: Qual é sua análise sobre o que está acontecendo e como pode repercutir no Oriente Médio?

Noam Chomsky: Em primeiro lugar, o que está ocorrendo é espetacular. A coragem, a determinação e o compromisso dos manifestantes merecem destaque, E, aconteça o que aconteça, estes são momentos que não serão esquecidos e que seguramente terão consequências a posteriori: constrangeram a polícia, tomaram a praça Tahrir e permaneceram ali apesar dos grupos mafiosos de Mubarak. O governo organizou esses bandos para tratar de expulsar os manifestantes ou para gerar uma situação na qual o exército pode dizer que teve que intervir para restaurar a ordem e depois, talvez, instaurar algum governo militar. É muito difícil prever o que vai acontecer.

Os Estados Unidos estão seguindo seu manual habitual. Não é a primeira vez que um ditador “próximo” perde o controle ou está em risco de perdê-lo. Há uma rotina padrão nestes casos: seguir apoiando o tempo que for possível e se ele se tornar insustentável – especialmente se o exército mudar de lado – dar um giro de 180 graus e dizer que sempre estiveram do lado do povo, apagar o passado e depois fazer todas as manobras necessárias para restaurar o velho sistema, mas com um novo nome.

Presumo que é isso que está ocorrendo agora. Estão vendo se Mubarak pode ficar. Se não aguentar, colocarão em prática o manual.

Amy Goodman: Qual sua opinião sobre o apelo de Obama para que se inicie a transição no Egito?

Noam Chomsky: Curiosamente, Obama não disse nada. Mubarak também estaria de acordo com a necessidade de haver uma transição ordenada. Um novo gabinete, alguns arranjos menores na ordem constitucional, isso não é nada. Está fazendo o que os líderes norteamericanos geralmente fazem.

Os Estados Unidos tem um poder constrangedor neste caso. O Egito é o segundo país que mais recebe ajuda militar e econômica de Washington. Israel é o primeiro. O mesmo Obama já se mostrou muito favorável a Mubarak. No famoso discurso do Cairo, o presidente estadunidense disse: “Mubarak é um bom homem. Ele fez coisas boas. Manteve a estabilidade. Seguiremos o apoiando porque é um amigo”.

Mubarak é um dos ditadores mais brutais do mundo. Não sei como, depois disso, alguém pode seguir levando a sério os comentários de Obama sobre os direitos humanos. Mas o apoio tem sido muito grande. Os aviões que estão sobrevoando a praça Tahrir são, certamente, estadunidenses. Os EUA representam o principal sustentáculo do regime egípcio. Não é como na Tunísia, onde o principal apoio era da França. Os EUA são os principais culpados no Egito, junto com Israel e a Arábia Saudita. Foram estes países que prestaram apoio ao regime de Mubarak. De fato, os israelenses estavam furiosos porque Obama não sustentou mais firmemente seu amigo Mubarak.

Amy Goodman: O que significam todas essas revoltas no mundo árabe?

Noam Chomsky: Este é o levante regional mais surpreendente do qual tenho memória. Às vezes fazem comparações com o que ocorreu no leste europeu, mas não é comparável. Ninguém sabe quais serão as consequências desses levantes. Os problemas pelos quais os manifestantes protestam vem de longa data e não serão resolvidos facilmente. Há uma grande pobreza, repressão, falta de democracia e também de desenvolvimento. O Egito e outros países da região recém passaram pelo período neoliberal, que trouxe crescimento nos papéis junto com as consequências habituais: uma alta concentração da riqueza e dos privilégios, um empobrecimento e uma paralisia da maioria da população. E isso não se muda facilmente.

Amy Goodman: Você crê que há alguma relação direta entre esses levantes e os vazamentos de Wikileaks?

Noam Chomsky: Na verdade, a questão é que Wikileaks não nos disse nada novo. Nos deu a confirmação para nossas razoáveis conjecturas.

Amy Goodman: O que acontecerá com a Jordânia?

Noam Chomsky: Na Jordânia, recém mudaram o primeiro ministro. Ele foi substituído por um ex-general que parece ser moderadamente popular, ou ao menos não é tão odiado pela população. Mas essencialmente não mudou nada.

Tradução: Katarina Peixoto

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Você está sendo filmado, não se importe!

Há alguns anos atrás, com a instalação das câmeras de vigilância, como uma tentativa de criar uma sensação de segurança, era colocada também nas paredes dos estabelecimentos uma plaquinha, com uma carinha risonha, pedindo "Sorria, você esta sendo filmado".

Inicialmente era algo que deixou muitas e muitas pessoas incomodadas, preocupadas. Estou sendo filmado? Por quê? O que vão fazer com minhas imagens? Ser filmado era algo incomum para a maioria da população. Isto há alguns anos, não muitos, caro leitor.

O tempo foi passando, a plaquinha com a carinha risonha foi sumindo, mas as câmeras não. Pelo contrário, aumentaram significativamente, nos estabelecimentos comerciais mais variadas, nos espaços públicos, em nossas residências e, com a popularização da tecnologia digital, ser fotografado ou filmado é algo que qualquer pessoa que tenha um celular (com câmera) pode fazer. Você esta sendo filmado? Sim, provavelmente algumas vezes por dia, sem sequer perceber ou se preocupar com isto. Naturalizamos este processo e as imagens agora se multiplicam e são publicizadas algumas infinitas vezes na internet.

As "vídeo cassetadas" (como um programa de domingo que chamava como uma das suas principais atrações os vídeos de tombos, escorregões e outras situações familiares captadas por câmeras domesticadas) já perderam a graça. Mortes, violência, agressões e outras situações reais é que causam impacto ou comoção e também não nos assustamos mais quando vemos alguém ser morto com 9, 10, 11 tiros, sentados em frente a televisão ou no computador.

Novos tempos. O artigo a seguir ilustra, a partir de uma visão de um repórter estadunidense, esta mudança de nossas sensações e compreensões deste mundo que para muitos dos mais jovens sempre teve internet, celular, dados digitais....

Você Está Sendo Observado, não Ligue

Temor sobre privacidade é exagerado, mesmo no mundo sempre conectado

por David Pogue


Em 2004, o Google lançou o Gmail: poderosa conta de e-mail com capacidade de armazenamento de um gigabyte – 500 vezes o que o Hotmail oferecia. Com tanta capacidade, o Gmail original nem sequer tinha o botão de excluir. E tudo gratuito.

Mas nem todos festejaram. O Gmail pagava por toda essa maravilha graças à exibição de pequenos textos de anúncio à direita de cada mensagem recebida, relacionados a seu conteúdo. Defensores de privacidade ficaram possessos. Parecia que, para eles, não importava o fato de que era um algoritmo de software e não um ser humano que vasculhava suas mensagens em busca de palavras-chave. O Electronic Privacy Information Center (Centro de Informação de Privacidade Eletrônica) exigiu o fechamento do Gmail, e um senador da Califórnia propôs um projeto de lei que tornava ilegal a pesquisa de conteúdo das mensagens recebidas.

Dois anos depois, um serviço chamado Futurephone permitia a qualquer um fazer uma quantidade ilimitada de chamadas internacionais gratuitas. Bastava discar uma linha em Iowa e então, após o sinal, digitar o número desejado. Não era preciso fornecer seu nome, endereço de e-mail ou qualquer outra informação.

Quando escrevi sobre o Futurephone para o New York Times, pensei estar fazendo um favor aos meus leitores, mas, em vez disso, deixei-os loucos tentando descobrir como a Futurephone ganhava dinheiro. Muitos concluíram que era um golpe muito elaborado para coletar números de telefone.

Mas por que, respondi em meu blog, o Futurephone teria todo esse trabalho se já existe uma lista telefônica nacional? Muito bem, meus preocupados leitores disseram então que, nesse caso, a Futurephone deve estar “ouvindo nossas conversas”.

Para muitas pessoas, parece que quanto mais tempo passamos on-line, mais ofertas de conveniência nos são feitas em troca de nossa privacidade. Cartões de fidelidade de supermercados nos oferecem descontos, mas também permitem rastrear o que estamos comprando e comendo. A Amazon.com nos saúda pelo nome e nos lembra o que já compramos. O Facebook reuniu o maior banco de dados de informações pessoais na história humana (mais de meio bilhão de pessoas). Os cartões de crédito deixam um rastro. Telefones dão às companhias telefônicas o registro de seus interlocutores.

Claro que existem boas razões para proteger certos aspectos de nossa privacidade. Não gostaríamos que informações médicas ou financeiras de nossa vida nos impedissem de conseguir um emprego ou até mesmo um encontro amoroso. Podemos não desejar que nossas proezas sexuais ou votos se tornem públicos.

Mas, além dessas exceções óbvias, os medos de falta de privacidade sempre foram mais uma reação emocional do que racional. (Alguém realmente se importa com que tipo de comida compramos? E, em caso afirmativo, isso faz alguma diferença?) E no mundo virtual, muito disso é simplesmente medo do desconhecido, do que é novo.

Com o tempo, conforme o desconhecido se torne familiar, cada nova onda de terror de privacidade on-line parece se desfazer. Ninguém se surpreende mais com os mapeamentos de propaganda do Gmail. E até mesmo pessoas de meia- idade e avós estão se inscrevendo no Facebook.

(E o Futurephone? Não existe mais. Blogueiros investigativos descobriram seu modelo de negócios mais provável: a empresa explorava um subsídio do governo, que pagaria ao Estado de Iowa alguns centavos por cada chamada de longa distância recebida. E Iowa estaria dividindo o lucro com o Futurephone.)

A geração mais jovem não consegue sequer compreender por que os mais velhos se preocupam tanto com a privacidade. De fato, todo o apelo dos mais recentes serviços on-line é divulgar informações pessoais. De propósito. Os aplicativos Foursquare, Gowalla e Facebook Places divulgam até mesmo a sua localização atual, para que seus amigos possam seguir seus movimentos (e, claro, encontrá-lo).

Se você está entre aqueles que pensam que o Google ultrapassou os limites da privacidade com o Gmail, então certamente está surtando com todas essas novidades. O Google está coletando dados sobre o que assistimos (Google TV), aonde vamos (Google Maps), para quem ligamos (telefones Android), o que dizemos (Google Buzz) e o que fazemos on-line (navegador Google Chrome).

Mas algumas defesas de nossa privacidade acabaram há anos. O medo que você sente pode ser real, mas o risco de alguém realmente estar buscando detalhes tediosos sobre sua vida é certamente pequeno. Como o medo de voar, ataques de tubarões ou de raios, seu instinto pode não estar recebendo dados realistas de seu cérebro.

David Pogue David Pogue é colunista de tecnologia pessoal do New York Times e ganhador do prêmio Emmy como correspondente da CBS News.

Fonte: http://www2.uol.com.br/sciam/artigos/voce_esta_sendo_observado_nao_ligue.html


quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

"O império americano precisava desesperadamente de Barack Obama"

A eleição de Obama, como presidente dos EUA, pareceu a muitos, uma forma de redenção do "Império" e uma nova geopolítica mundial poderia estar surgindo neste processo. Infelizmente, o que visualizamos nos últimos meses, é a continuação das mesmas políticas e do imobilismo do presidente dentro e fora do país nas tão faladas mudanças que seriam geradas.

Este trecho da entrevista do historiador e escritor paquistanês Tariq Ali traz algumas provocações e indagações interessantes. Vale a pena conferir a leitura quem se busca entender as estratégias e políticas internacionais oriundas do impacto do 11 de setembro de 2001!

Entrevista Tariq Ali:
"O império americano precisava desesperadamente de Barack Obama"

Por Tatiana Merlino

Enganaram-se aqueles que acreditaram que Obama representaria uma mudança na política interna e externa da principal economia do mundo. “Muitas pessoas acreditaram em Obama e se esqueceram que ele levantou mais dinheiro de Wall Street do que Hillary Clinton e John McCain juntos. O banco Goldman Sachs e muitos outros deram-lhe milhões”, afirma Tariq Ali, escritor e historiador de origem paquistanesa e radicado na Inglaterra. Ali, que está entre um dos mais respeitados intelectuais de esquerda, lançou, recentemente, o livro The Obama Syndrome: Surrender at Home, War Abroad (A síndrome de Obama: capitulação em casa, guerra fora), ainda sem previsão para publicação em português. Na obra, Tariq Ali analisa os primeiros 18 meses do presidente, que define como um “político-máquina do Partido Democrata em Chicago”.

Nesta entrevista, o historiador também discute a relação dos Estados Unidos com o Paquistão, país que, segundo ele, está sendo usado pelos interesses estadunidenses na guerra do Afeganistão. “Muitos dos terroristas de hoje foram treinados nos Estados Unidos, onde aprenderam como atirar em helicópteros. Hoje é altamente irônico que eles estejam fazendo isso contra os Estados Unidos”.

Tariq Ali ainda analisa a crise financeira mundial de 2008, que, define como a mais séria crisedo capitalismo desde 1929. Sobre o processo eleitoral brasileiro, Tariq Ali, bastante crítico ao governo Lula, disse que ficou feliz por José Serra ter sido derrotado nas urnas, mas quando viu a presidente eleita numa foto com Antonio Palocci (que será o ministro da Casa Civil de Dilma) pensou “ai, meu deus... Esse cara é o mais articulado defensor de políticas econômicas neoliberais e o país não precisa de pessoas como ele, mas sim de pessoas que pensem diferente”.

Caros Amigos - Queria começar por seu último livro: “A Síndrome de Obama: Capitulação em casa, Guerra fora”. O que aconteceu, por que Obama está rendido em casa, foi uma cilada?
Tariq Ali - Não, não é uma cilada. Basicamente é importante entender que Obama é, essencialmente, um político-máquina, da máquina do Partido Democrata em Chicago. Um dos piores do país. No meu livro sobre Obama eu o descrevo como a aparição mais inventiva que o império criou de si mesmo. O império americano precisava de Obama, desesperadamente. Muitas pessoas assumiram, automaticamente, que Obama seria melhor do que Bush. Não apenas nos Estados Unidos. No mundo inteiro. Eles tinham ilusões reais. Até pessoas de esquerda, até o lideres bolivarianos, como Hugo Chávez. Eles tinham verdadeira esperança, não ilusões. Lula realmente acreditou quando Obama disse “sim, intervenha em nosso nome com o Irã”. Não é que Lula foi como a imprensa disse: “ele foi ingênuo”. Não é uma questão de ingenuidade. Obama disse ao Lula e para o líder turco, “por favor, nos ajude com o Irã”, e eles o fizeram. Eles conseguiram que os iranianos concordassem com o plano, e então os americanos recuaram.

Muitas pessoas acreditaram em Obama e se esqueceram que ele levantou mais dinheiro de Wall Street do que Hillary Clinton e John McCain juntos. O Goldman Sachs e muitos outros deram-lhe milhões. Eles não iam tocar um música que Wall Street não gostasse. Isso era óbvio. As pessoas achavam que as reformas da saúde seriam reformas de verdade, que haveria serviço de saúde de verdade, como há na Europa. Eles subestimaram o lobby da indústria farmacêutica e das empresas de plano de saúde e asseguraram que as reformas estavam sob seu controle. Então, quando houve as pressões das corporações nos Estados Unidos, Obama capitulou. Fora do país, houve guerra, como usualmente. Mas, internamente, mesmo com promessas que não tem nada a ver com as corporações, como “iremos fechar Guantánamo”, não se fez nada. Com o que se prometeu de “iremos acabar com tortura, rendições”, também nada. O chefe da CIA, Leon Panetta, foi questionado sobre as torturas, e nada ocorreu. Então, o desapontamento entre seus próprios apoiadores nos EUA é muito alto. Eu estava nos Estados Unidos durante a campanha de Obama, e não há dúvida que entre as idades de 18 e 26, uma quantidade enorme de jovens se mobilizaram por ele. Então, essas são as pessoas mais desapontadas com Obama nos EUA.

Caros Amigos - Quais são as consequências desse desapontamento?
Nas eleições de meio mandato, muitos dos apoiadores de Obama não votaram, eles ficaram em casa. Então, os republicamos ganharam a Câmara dos Representantes, com uma maioria enorme, e no Senado, teve uma pequena maioria para o Obama, mas eles perderam. E se continuar assim, é uma pergunta em aberto o que irá acontecer em 2012. Não que isso importe, pois o sistema é tão forte agora, que é necessário ser um presidente muito corajoso e confiante para mudar isso, mesmo que pouco.

Caros Amigos - Como a guerra no Afeganistão está afetando o Paquistão? Por que os Estados Unidos querem comprometer Paquistão contra os talebans?
Os Estados Unidos não podem acreditar que eles não podem ganhar aquela guerra. Então, eles precisam achar pessoas para culpar e quem eles podem mais facilmente culpar é o Paquistão. Então, é por isso que eles estendem a guerra ao Paquistão. Isso criou uma situação em que uma pesquisa de opinião conduzida por uma organização estadunidense descobriu que 70% dos paquistaneses dizem que o maior mal no mundo são os Estados Unidos. E isso não é oposição religiosa e sim oposição política ao projeto americano. Isso é, essencialmente, porque os Estados Unidos fizeram isso. Isso criou uma confusão enorme, não apenas no Afeganistão, mas também no Paquistão, e essa é uma história triste. Muitas pessoas, incluindo eu, os odiamos. Se você mantém a guerra, há possibilidades perigosas para todo mundo, para o país, e não se pode ganhar a guerra no Afeganistão assim. Essa é a guerra que eles não podem ganhar. Como você pode ganhar uma guerra quando a maioria das pessoas se opõe à sua presença?

Caros Amigos - Como é a situação no Paquistão, hoje?
Eu analiso o Paquistão em um meu livro Duelo. É um país onde há uma elite e exército corruptos e venais. Todos eles prontos para ganhar dinheiro e prontos para fazer o que os Estados Unidos querem. É um país onde não há educação para os pobres, não há saúde, moradia e comida para pobres. E é um país grande, de 200 milhões de pessoas. E a imagem que as pessoas tem é de um país fora do controle, com pessoas loucas com barba. E é uma imagem horrível. E não é verdade. Quando há eleições, menos de 5% da população vota nos partidos religiosos moderados. A maioria não gosta deles. Provavelmente há mais religiosos fundamentalistas nos Estados Unidos e no Brasil do que no Paquistão. Então, o problema real do país é pobreza e má nutrição. E se algum governo tentar resolver esses problemas, o país será transformado, mas eles não fazem isso, porque se sentem ameaçados. É uma classe dominante realmente nojenta. Eles apenas querem fazer dinheiro. E o presidente atual do Paquistão, Asif Ali Zardari é um criminoso. E todo país sabe disso. Mas os Estados Unidos gostam dele porque ele faz o que eles dizem.

Caros Amigos - O que eles pedem?
“Fazer o que dizemos, vá e brigue aqui, vá e brigue lá”, e os Estados Unidos controlam esse país há muito tempo. Agora culpam o país sobre o que eles pediram para fazer no passado. Como esses pequenos grupos extremistas surgiram? Porque eles estavam em guerra pelos Estados Unidos contra a União Soviética nos anos 1980. Eles foram criados pelos EUA. Os livros que eles estudavam nas escolas religiosas foram publicados no Arizona, na Universidade de Nebraska. Muitos dos terroristas de hoje foram treinados nos Estados Unidos, onde aprenderam como atirar em helicópteros. Hoje é altamente irônico que eles estejam fazendo isso contra os Estados Unidos. É um país que está sendo usado. Um general aposentado me disse uma vez e eu coloquei isso num dos meus artigos. Ele disse “você tem que entender que para os Estados Unidos o Paquistão é como uma camisinha. Eles nos usam e nos descartam”. É uma descrição muito gráfica.

Caros Amigos - O país está sendo usado para confrontar os talebans também?
Sim, mas eles não podem. Ele está sendo usado, mas os militares não querem fazer isso porque pode criar problemas ao matar pessoas que os ajudaram no passado. Hoje, vemos os Estados Unidos usando o Paquistão militarmente para dialogar com o taleban ou com os neotalebans, os novos grupos que estão surgindo. Nos últimos três, quatro anos tem havido discussões entre os talebans, insurgentes e agências de inteligência dos Estados Unidos. E os EUA estão dizendo, “juntem-se ao governo de coalizão em Cabul”, e eles disseram: “enquanto vocês estiverem no nosso país, não o faremos. Primeiro, todas as tropas estrangeiras devem sair, e depois nós decidimos o que faremos”.

Caros Amigos - Como o senhor vê a reação de Obama em relação ao vazamento das informações do WikiLeaks sobre as violações de direitos humanos?
Basicamente, todos sabem o que eles fazem. E os WikiLeaks não foram uma surpresa para ninguém. O argumento de que tais documentos colocam em risco de vida os americanos é estúpido, porque isso é assumir que o país onde isso está acontecendo as pessoas não sabem disso, isso é novo para elas. Eles sabem disso, então por que estão em perigo, se não é um segredo? Os americanos torturaram pessoas no Vietnã, abertamente, então por que é um grande segredo que impérios torturam suas vítimas e sua resistência? Eles fazem isso na prisão de Bagram, no Afeganistão, que é uma câmara de horror comparada com Guantánamo.

Para ler a entrevista completa e outras matérias confira edição de janeiro da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.

Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Por que temer o espírito revolucionário árabe?

Frente as mobilizações populares no Egito desde o fim de janeiro e inícios de fevereiro de 2001, vale a pena a leitura do texto do filósofo esloveno Slavoj Zizek. As contradições do discurso ocidental acerca da democratização são cada vez mais presentes e perceptíveis nos meios midiáticos nestas últimas décadas. 

A liberdade defendida, especialmente pelos EUA e países europeus, é muitas vezes as favoráveis a estes e as elites aliadas, do que efetivamente à população local. O movimento egípcio pode se tornar um ícone neste processo de rompimento com os governos ditatoriais, apoiados pelo Ocidente, que assolam os países árabes, em especial do Oriente Médio. 

Por que temer o espírito revolucionário árabe?

A reação ocidental aos levantes no Egito e na Tunísia frequentemente demonstra hipocrisia e cinismo. A hipocrisia dos liberais ocidentais é de tirar o fôlego: eles publicamente defendem a democracia e agora, quando o povo se rebela contra os tiranos em nome de liberdade e justiça seculares, não em nome da religião, eles estão todos profundamente preocupados. Por que aflição, por que não alegria pelo fato de que se está dando uma chance à liberdade? Hoje, mais do que nunca, o antigo lema de Mao Tsé-Tung é pertinente: "Existe um grande caos abaixo do céu - a situação é excelente". O artigo é de Slavoj Zizek.
"O que não pode deixar de saltar aos olhos nas revoltas Tunísia e Egito é a notável ausência do fundamentalismo islâmico. Na melhor tradição democrática secular, as pessoas simplesmente se revoltaram contra um regime opressivo, sua corrupção e pobreza, e demandaram liberdade e esperança econômica. A sabedoria cínica dos liberais ocidentais - de acordo com os quais, nos países árabes, o genuíno senso democrático é limitado a estreitas elites liberais enquanto que a vasta maioria só pode ser mobilizada através do fundamentalismo religioso ou do nacionalismo - se provou errada.

Quando um novo governo provisório foi nomeado na Tunísia, ele excluiu os islâmicos e a esquerda mais radical. A reação dos liberais presunçosos foi: bom, eles são basicamente a mesma coisa; dois extremos totalitários - mas as coisas são simples assim? O verdadeiro antagonismo de longa data não é precisamente entre islâmicos e a esquerda? Ainda que eles estejam momentaneamente unidos contra o regime, uma vez que se aproximam da vitória, a sua unidade se parte e eles se engajam numa luta mortal, frequentemente mais cruel do que aquela travada contra o inimigo comum.

Nós não testemunhamos precisamente tal luta depois das eleições no Irã? As centenas de milhares de apoiadores de Mousavi lutavam pelo sonho popular que sustentou a revolução de Khomeini: liberdade e justiça. Ainda que esse sonho tenha sido utópico, ele levou a uma explosão de criatividade política e social de tirar o fôlego, experiências de organização e debates entre estudantes e pessoas comuns. Essa abertura genuína, que liberou forças de transformação social então desconhecidas, um momento no qual tudo pareceu possível, foi então gradualmente sufocada pela dominação do controle político e do establishment islâmico.

Mesmo no caso de movimentos claramente fundamentalistas, é preciso ser cuidadoso para não perder de vista o componente social. O Talibã é usualmente apresentado como um grupo fundamentalista islâmico que impõe suas leis pelo terror. No entanto, quando, na primavera de 2009, eles tomaram o Vale de Swat no Paquistão, o The New York Times noticiou que eles arquitetaram "uma revolta de classe que explora profundas fissuras entre um pequeno grupo de ricos donos de terra e seus inquilinos desprovidos de um chão". Se, ao "se aproveitar" dos apuros dos agricultores, o Talibã estava criando, nas palavras do New York Times, "um alerta sobre os riscos ao Paquistão, que permanece sendo largamente feudal", o quê impediu os democratas liberais do Paquistão e dos Estados Unidos de, da mesma forma, "se aproveitarem" desses apuros e de tentarem ajudar os agricultores sem terra? Ocorre de as forças feudais no Paquistão serem aliados naturais da democracia liberal?

A conclusão inevitável a ser delineada é que a ascensão do islamismo radical sempre foi o outro lado do desaparecimento da esquerda secular nos países muçulmanos. Quando o Afeganistão é retratado como sendo o exemplo máximo de um país fundamentalista islâmico, quem ainda se lembra que, há quarenta anos atrás, ele era um país com uma forte tradição secular, incluindo um poderoso partido comunista que havia tomado o poder lá sem dependência da União Soviética? Para onde essa tradição secular foi?

É crucial analisar os eventos em andamento na Tunísia e no Egito (e no Iémen e ... talvez, com esperança, até na Arábia Saudita) em contraste com esse pano de fundo. Se a situação for eventualmente estabilizada de modo ao antigo regime sobreviver, apenas passando por alguma cirurgia cosmética liberal, isso irá gerar um intransponível retrocesso fundamentalista. Para que o legado chave do liberalismo sobreviva, os liberais precisam da ajuda fraternal da esquerda radical. De volta ao Egito, a mais vergonhosa e perigosamente oportunista reação foi aquela de Tony Blair noticiada na CNN: mudança se necessário, mas deverá ser uma mudança estável. Mudança estável no Egito, hoje, só pode significar um compromisso com as forças de Mubarak na forma de ligeiramente alargar o círculo do poder. Este é o motivo pelo qual é uma obscenidade falar em transição pacífica agora: pelo esmagamento da oposição, o próprio Mubarak tornou isso impossível. Depois de Mubarak enviar o exército contra os protestantes, a escolha se tornou clara: ou uma mudança cosmética na qual alguma coisa muda para que tudo continue na mesma, ou uma verdadeira ruptura.

Aqui, portanto, é o momento da verdade: ninguém pode arguir, como no caso da Argélia uma década atrás, que permitir eleições verdadeiramente livres equivale a entregar o poder para fundamentalistas islâmicos. Outra preocupação liberal é de que não existe poder político organizado para tomar o poder caso Mubarak parta. É claro que não existe; Mubarak se assegurou disso ao reduzir a oposição a ornamentos marginais, de forma que o resultado acaba sendo como o título do famoso romance de Agatha Christie, "E Então Não Havia Ninguém". O argumento de Mubarak - é ele ou o caos - é um argumento contra ele.

A hipocrisia dos liberais ocidentais é de tirar o fôlego: eles publicamente defendem a democracia e agora, quando o povo se rebela contra os tiranos em nome de liberdade e justiça seculares, não em nome da religião, eles estão todos profundamente preocupados. Por que aflição, por que não alegria pelo fato de que se está dando uma chance à liberdade? Hoje, mais do que nunca, o antigo lema de Mao Tsé-Tung é pertinente: "Existe um grande caos abaixo do céu - a situação é excelente".

Para onde, então, Mubarak deve ir? Aqui, a resposta também é clara: para Haia. Se existe um líder que merece sentar lá, é ele."

(*) Nota do Tradutor: o título original do livro de Agatha Christie é "And Then There Were None", conhecido aqui no Brasil como "O Caso dos Dez Negrinhos".

Referências feitas pelo autor:
http://www.guardian.co.uk/world/2010/feb/02/iran-mousavi-dictatorship-khameini-protests

http://www.nytimes.com/2009/04/17/world/asia/17pstan.html?_r=1

Fonte: http://www.guardian.co.uk

Traduzido por Henrique Abel para o Diário Liberdade.
 
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17357&boletim_id=818&componente_id=13443  

Consulado americano classificava brasileiros como personagens de cinema

As representações sobre o  Brasil e sua população são as mais variadas pelo mundo afora, bem como nós também temos nossas imagens e representações dos países estrangeiros. A matéria abaixo é um exemplo de como as visões estereotipadas se mantém mesmo dentro das estruturas dos Estados. Se fosse quiser entrar nos Estados Unidos, tome cuidado como vai se apresentar no Consulado! 

Um documentário interessante é "olhar estrangeiro" de Lúcia Murat, lançado em 2006, que faz uma análise dos filmes produzidos pelo cinema internacional sore o Brasil.


Consulado americano classificava brasileiros como personagens de cinema1 de fevereiro de 2011 às 17:11h

Os trabalhadores que pediam visto temporário poderiam ser descritos como bons, maus ou feios

Documento do consulado americano de São Paulo, divulgado pelo site  WikiLeaks,  mostra que brasileiros que buscam vistos temporários de trabalho são classificados internamente como personagens de filme.

De acordo com o página da web, no despacho datado de dezembro de 2005 o ex-cônsul-geral Christpher J. McMullen classifica aqueles que solicitam a autorização com os adjetivos “bom”, “mau” e “feio”. Mullen usa como referência o filme “The Good, The Bad and The Ugly”, de Sergio Leone.

Clint Eastwood seria o “bom” que no filme trata-se de um pistoleiro, refinado e ético, já no consulado refere-se aos jovens de classe média, que frequentaram boas escolas e que pretendem sair do País para trabalharem temporariamente em hotéis ou estações de esqui com o objetivo de aperfeiçoarem a língua inglesa, até retornarem ao Brasil.

O “mau”, que é desprovido de ética, seriam parentes e amigos daqueles que saíram ilegalmente em busca de empregos modestos como peixeiros ou lavadeiras. Esses representariam o maior risco, já que com o visto temporário em mãos  dificilmente voltariam ao Brasil.

Já o “feio”, que na película é rude e descuidado, seriam os pobres, que segundo o documento, deixam de gastar com coiotes – pessoas que cobram até US$ 10 mil para fazer a travessia de imigrantes ilegais pela fronteira do México – para gastarem com petições de trabalho falsas que custam um terço do valor. Esses, ao conseguirem a autorização, invariavelmente desaparecem juntamente com os imigrantes ilegais brasileiros de Massachussets.

O documento afirma ainda que naquele ano, 49% dos pedidos de visto de trabalho, entre os meses de janeiro a novembro de 2005, foram negados.

Leia no Blog de Natalia Viana, do WikiLeaks : http://cartacapitalwikileaks.wordpress.com/

Fonte: http://www.cartacapital.com.br/politica/consulado-americano-classificava-brasileiros-como-personagens-de-cinema

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

BBB 11 - Ética pelo ralo

BBB 11 - Ética pelo ralo

O formato é o mesmo já consagrado pelo público e pelos anunciantes: invasão de privacidade com a venda de corpos quase sempre sarados, bronzeados e bem torneados e com a exposição de mentes vazias a abrigar ideias que trafegam entre a futilidade e a galeria de preconceitos.

Publicado originalmente no Observatório da Imprensa

No dia 11/1/201 a TV Globo levou ao ar seu programa de maior audiência no verão brasileiro: Big Brother Brasil 11. Sucesso de público, sucesso de marketing, sucesso financeiro, sempre na casa dos milhões de reais. Fracasso ético, fracasso de cidadania, fracasso de respeito aos direitos humanos fundamentais.

O prêmio será de R$ 1,5 milhão para o vencedor. O segundo e terceiro lugares levam, respectivamente, R$ 150 mil e R$ 50 mil. As inscrições para a próxima edição do BBB já estão encerradas. Ao todo, nas dez edições, foram 140 participantes. E já foram entregues mais de R$ 8,5 milhões em prêmios. Balanço raquítico, tanto numérico quanto financeiro para seus participantes, para um programa que se especializou em degradar a condição humana.

Aos 11 anos de existência, roubando sempre 25% do ano (janeiro a março) e agora entrando na puberdade como se humano fosse, o BBB começa anunciando que passará por mudanças na edição 2011. Se você pensou que as mudanças seriam para melhorar o que não tem como ser melhorado se enganou redondamente. O formato será sempre o mesmo, consagrado pelo público e pelos anunciantes: invasão de privacidade com a venda de corpos quase sempre sarados, bronzeados e bem torneados e com a exposição de mentes vazias a abrigar ideias que trafegam entre a futilidade e a galeria de preconceitos contra negros, pobres, analfabetos funcionais.

Após dez anos seguidos, sabemos que a receita do reality show inclui em sua base de sustentação as antivirtudes da mentira, da deslealdade, dos conluios e... da cafajestagem. Aos poucos, todos irão se despir de sua condição humana tão logo um deles diga que "isto aqui é um jogo". Outros ensaiarão frases pretensamente fincadas na moral: "Mas nem tudo vou fazer para ganhar esse jogo."

Como miquinhos amestrados, os participantes estarão ali para serem desrespeitados, não poucas vezes humilhados e muitas vezes objeto de escárnio e lições filosóficas extraídas de diferentes placas de caminhões e compartilhadas quase diariamente pelo jornalista Pedro Bial, ao que parece, senhor absoluto do reality show. Não faltarão "provas" grotescas, como colocar uma participante para botar ovo a cada trinta minutos; outra para latir ou miar a cada hora cheia; algum outro para passar 24 horas de sua vida fantasiado de bailarina ou para pular e coaxar como sapo sempre que for ativado determinado sinal acústico. O domador, que terá como chicote sua lábia de ocasião ou nalgumas vezes sua língua afiada, continuará sendo Pedro Bial que, a meu ver, representa um claro sinal de como as engrenagens que movem a televisão guardam estreita semelhança com aqueles velhos moedores de carne.

O último a sair da jaula
É inegável que Bial é talentoso. É inegável que passou parte de sua vida tendo páginas de livros ao alcance das mãos e dos olhos. É inegável também que parece inconsciente dos prejuízos éticos e morais que haverá de carregar vida afora. Isto porque a cada nova edição do reality mais se plasmam os nomes BBB e Pedro Bial. E será difícil ao ouvir um não lembrar imediatamente o outro. Porque lançamos aqui nosso nome, que poderá ter vida fugaz de cigarra ou ecoará pela eternidade. Imagino, daqui a uns 25 anos, em 2035, quando um descendente deste Pedro for reconhecido como bisneto daquele homem engraçado que fazia o Big Brother no Brasil. E os milhares de vídeos armazenados virtualmente no YouTube darão conta de ilustrar as gerações do porvir.

E, no entanto, essas quase duas dezenas de jovens estarão ali para ganhar fama instantânea, como se estivessem acondicionados naqueles pacotinhos de sopa da marca Miojo. Imagino cada um deles a envergar letreiro imaginário a nos dizer com a tristeza possível que "Coloco à venda meu corpo sem alma, meu coração quebrado e minha inteligência esgotada; vendo tudo isso muito barato porque vejo que há muita oferta no mercado". E teremos aquele interminável desfile de senso comum. Afinal, serão 90 dias de vida desperdiçada, ou melhor, de vida em que a principal atividade humana será jogar conversa fora. O que dá no mesmo. E não será o senso comum exatamente aquele conjunto de preconceitos adquiridos antes de completarmos 15 anos de vida?

Friederich Nietzsche (1844-1900) parecia ter o dom da premonição. É que o filósofo alemão se antecipava muito quando se tratava de projetar ideias sobre a condição humana. É dele esta percepção: "O macaco é um animal demasiado simpático para que o homem descenda dele". Isto porque Nietzsche foi poupado de atrações quase sérias e semi-circenses, como o BBB. No picadeiro, o macaco é aplaudido por sua imitação do humano: se equilibra e passeia de triciclo e de bicicleta, se veste de gente, com casaca e gravata, sabe usar vaso sanitário, descasca alimentos. No picadeiro do BBB, os seres humanos são aplaudidos por se mostrarem intolerantes uns com os outros, se vestem de papagaios, ladram, miam, coaxam, zumbem – e tudo como se animais fossem. Chegam a botar ovo em momento predeterminado. Se vestem de esponja e se encharcam de detergente a limpar pratos descomunais noite afora.

Em sua imitação de animal, o humano que se sobressai no BBB é aquele que consegue ficar engaiolado – digo, literalmente engaiolado – junto com outros bípedes não emplumados – por grande quantidade de horas. E sem poder satisfazer as necessidades humanas básicas, muitas vezes tendo que ficar em uma mesma posição, como seriemas destreinadas. E são os únicos animais que demonstram imensa felicidade em permanecer por mais tempo na gaiola. Não lhes jogam bananas nem pipocas, mas quem for o último a sair da jaula semi-humana ganha uma prenda. Pode ser um passeio de helicóptero, pode ser um carro, pode ser uma noite na Marquês de Sapucaí.

Heidegger reconheceria
O leitor atento deve ter percebido que em algum momento deste texto mencionei que o BBB 11 terá mudanças. Nem vou me dar ao trabalho de editar. Eis o quecopiei do site G1:

"Boninho, diretor do BBB, falou em seu Twitter nesta quarta-feira, 24/11, sobre a nova edição do programa, a 11ª, que estreará em janeiro de 2011. E ele adianta que, desta vez, as coisas vão mudar. ‘Esse ano tudo vai ser diferente... Nada é proibido no BBB, pode fazer o que quiser’, postou Boninho em seu microblog. Questionado sobre o que estaria liberado no confinamento que não estava em edições anteriores, ele respondeu: ‘Esse ano... liberado! Vai valer tudo, até porrada’. Boninho também comentou sobre as bebidas no reality show: ‘Acabou o ice no BBB... Vai ser power... chega de bebida de criança’, escreveu."

Não terá chegado a hora de o portentoso império Globo de comunicação negociar com o governo italiano a cessão do Coliseu romano para parte das locações, ao menos aquelas em que murros e safanões, sob efeito de álcool ou não, certamente ocorrerão? E como nada compreendo de Heidegger, só me resta dizer que ao longo de toda sua vida madura Heidegger esteve obcecado pela possibilidade de haver um sentido básico do verbo "ser" que estaria por trás de sua variedade de usos. E são recorrentes suas concepções quanto ao que existe, o estudo do que é, do que existe: a questão do Ser (i.e. uma Ontologia) dependente dos filósofos antes de Sócrates, da filosofia de Platão e de Aristóteles e dos Gnósticos.

Quem sabe tivesse assistido uma única noite do BBB – caso o formato da Endemol estivesse em cena antes de 1976 –, o filósofo, por muitos cultuado, não apenas teria uma confirmação segura de que não valia mesmo a pena publicar o segundo volume de sua obra principal, O Ser e o Tempo, como também haveria de reconhecer a inexistência de algo anterior ao ser. Mas, com certeza, se fartaria com a miríade de usos dados ao verbo "ser".

Washington Araújo é jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela
UNB, tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil,
Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org
Email - wlaraujo9@gmail.com

Disponivel em: http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=4927