Metamorfoses Históricas: História, livros, músicas, cinema e motos!

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quarta-feira, 16 de maio de 2012

Comissão Nacional da Verdade: a ditadura em questão

Após idas e vindas e muitos anos de "anistia", o Estado Brasileiro inicia o processo de tentar esclarecer um pouco mais o processo histórico e suas consequências do período em que os militares estiveram no poder no Brasil, entre 1964 e 1985. Diferente de muitos setores da sociedade que defendem diferentes argumentos para não haver comissões ou discussões sobre o tema, a instauração da chamada Comissão da Verdade, pode trazer a tona o iceberg escondido abaixo da superfície do que sabemos até o momento das ações e medidas tomadas pela repressão militar aos grupos civis ou indivíduos que se opuseram de forma pacífica ou armada ao regime. Saberemos a verdade? Mas qual verdade? Com certeza uma verdade com algumas diferenças sobre o que sabemos até este momento. Que a história da ditadura militar possa ser reescrita em nossos livros didáticos nos próximos anos com as contribuições desta Comissão. Assim espero....


A história que a Comissão da Verdade precisa contar  ( 16 de maio - 2012) 

Por José Antonio Lima - Carta Capital 

A presidenta Dilma Rousseff, ao lado dos quatro ex-presidentes da República vivos, instalou nesta quarta-feira 16 a Comissão da Verdade, cujo objetivo, exposto na lei 12.528, é “examinar e esclarecer graves violações de direitos humanos” praticadas entre 1946 e 1988. Antes mesmo de sua instalação, a comissão se viu envolta em uma celeuma: a comissão deve focar apenas as violações cometidas por agentes do estado ou também ofensas aos direitos humanos realizadas por determinados setores da luta armada? Esta discussão é torta, deslocada da realidade e encontra suas raízes numa interpretação falsa do que houve em 1964.
A polêmica deriva da falta de precisão do texto que cria a comissão e não estabelece claramente qual é seu “alvo”. Assim, cabe aos integrantes da comissão decidir a forma como ela deve atuar. O advogado José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso, disse inicialmente, à Folha de S.Paulo, que “tudo” seria analisado. No dia seguinte, ao Estado de S.Paulo, afirmou que o objetivo principal da comissão seria investigar as violações de direitos humanos cometidos por agentes de Estado. Companheiros de Dias discordam dele. Paulo Sergio Pinheiro, ministro de Direitos Humanos no governo FHC, afirmou que o “único lado” é o das vítimas de violações praticadas por agentes do Estado. A professora e advogada Rosa Cardoso, defensora de Dilma quando a presidenta foi presa e torturada nos 1970, concordou com Pinheiro.
A discussão fez dois ex-ministros trocarem acusações. Nelson Jobim, ministro da Defesa nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma, alardeou um acordo supostamente firmado na época da redação do texto. Segundo Jobim, o acordo previa que ações da esquerda armada também seriam investigadas. Paulo Vannuchi, ex-ministro da secretaria de Direitos Humanos da Presidência, acusou Jobim de mentir.
A postura de Jobim ecoa as posições de alguns setores militares. O general da reserva Marco Antônio Felício da Silva, afirmou ao Estado de S.Paulo que o objetivo da comissão é colocar os grupos armados “como democratas e defensores da liberdade e dos direitos humanos quando, no passado, desejavam a derrubada do governo e a instalação de uma ditadura do proletariado por meio da luta armada, usando do terrorismo”. O que está por trás deste tipo de pensamento? Não é preciso ter dúvidas. Para muitos brasileiros, incluindo diversos militares, o que ocorreu em 31 de março de 1964 foi correto. Foi, para eles, não um golpe, mas sim uma revolução para impedir a suposta tomada de poder por comunistas. Essa versão serve para esconder o fato de que o golpe foi um levante, militar e civil, apoiado inclusive por empresários e veículos de comunicação, contra um governo frágil e de pouca habilidade política cuja atuação indicava a redução de privilégios de algumas das elites nacionais.
Essa argumentação desconsidera dois aspectos fundamentais. O primeiro confunde o que houve no Brasil entre 1964 e 1985 com uma guerra civil. Os crimes da esquerda, entre eles atentados terroristas, já foram investigados e julgados. Os militantes anti-regime eram, do ponto de vista da lei, criminosos comuns. Alguns dos processos contra eles se deram em tribunais que consistiam clamorosas farsas. Houve até condenações à pena de morte, como a do ex-militante Ottoni Fernandes Júnior. Foi justamente na busca a esses setores da esquerda que o regime de exceção da época, ilegítimo por não ter sido eleito, cometeu graves violações de direitos humanos até hoje jamais investigadas.
O segundo aspecto deixado de lado por quem advoga peso igual para as violações cometidas pelo estado e por civis é que os dois tipos de violência não podem, de forma alguma, ser igualados. O Estatuto de Roma, base do Tribunal Penal Internacional, estabelece que crimes contra a humanidade são “ofensas à dignidade humana, graves humilhações e degradação” contra “um ou mais seres humanos” que sejam “parte de uma política de governo ou toleradas por um governo ou autoridade”. No Brasil, foi exatamente isso o que houve. Agentes do estado, cuja missão era zelar pelos direitos daqueles sob sua custódia, violaram sistematicamente, sob ordens superiores e cadeia de comando, esses direitos e também as constituições vigentes na época. Entre os crimes citados no Estatuto de Roma estão três que foram amplamente cometidos pelo estado brasileiro: assassinato, tortura e perseguição política. E por que há pesos diferentes para a violência estatal e para a cometida por civis? Porque um mundo civilizado simplesmente não pode conviver com estados que cometam crimes contra sua própria população.
A Comissão da Verdade tem um objetivo específico e muito claro. Ela não foi criada para esconder que muitos setores da esquerda nos anos 1960 e 1970 eram também pouco ou nada democráticos, para esquecer atentados e suas vítimas ou para dizer que o sistema de indenização aos prejudicados pela ditadura é perfeito. A comissão é uma tentativa de contar a verdadeira história das violações de direitos humanos que o estado brasileiro cometeu contra brasileiros e imortalizar este drama para que ele nunca mais se repita.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

O processo de colonização dos diferentes territórios por europeus, levou a perda de tesouros e símbolos para diferentes culturas. O que muitas pessoas observam com olhar de admiração nos museus europeus referente as culturas asiáticas, africanas ou americanas, pode ter sido fruto desse processo de perda no período de ocupação. O Egito é emblemático neste sentido, pela quantidade de bens retirados do seu local original e mostrados hoje em museus. Como reverter este processo? É correta a permanência destas peças na Europa ou as mesmas devem voltar a seus países de origem?

09 de maio de 2012

Homenagem do Google a Howard Carter reabre discussão sobre antiguidades

Arqueólogo britânico descobriu a tumba de Tutancamon; Egito exige devolução de objetos levados à Europa e EUA

No dia em que o Google homenageia o arqueólogo e egiptólogo britânico Howard Carter, uma velha discussão volta a tomar conta do campo das artes e da cultura. Trata-se dos pedidos do Egito para que museus da Europa e dos Estados Unidos devolvam peças históricas que foram levadas do país nos últimos séculos, em grande parte de forma ilegal.

A discussão já é antiga. Em outubro de 2009, os egípcios pressionaram e a França mostrou-se disposta a devolver cinco fragmentos de afrescos pintados em tumbas antigas. As peças haviam sido adquiridas pelo museu do Louvre entre 2000 e 2003, segundo o ministro francês da Cultura à época, Frederic Mitterand.
Na ocasião, o ministro alegou que as peças teriam sido adquiridas “de boa fé” pelo Louvre. Os egípcios não aceitaram as desculpas francesas e liderados por Zahi Hawass, um dos principais arqueólogos do Egito e à época diretor do Conselho Supremo para Antiguidades, afirmaram que não mais cooperariam com o museu francês caso as peças não fossem devolvidas.
Em 2011, a discussão voltou a ser intensificada e o museu Metropolitan de Nova York concordou em devolver aos egípcios 19 peças antigas que datam da época do faraó Tutancâmon.
Os objetos, que teriam sido levados retirados do Egito justamente por Carter, incluem um cachorro de bronze de dois centímetros de altura e parte de um bracelete que também havia sido encontrada pelo arqueólogo junto à tumba de Tutancâmon.
Carter examina a tumba redescoberta de Tutancâmon

Nem mesmo as revoltas contra o ex-presidente egípcio Hosni Mubarak, que deixou o poder em fevereiro do ano passado, fizeram com que as reivindicações do país perdessem força. Durante alguns protestos contra o antigo governo, manifestantes entraram em alguns museus do Cairo e certas peças foram danificadas.
Os egípcios exigem ainda a devolução da Pedra de Roseta e do busto de Ramsés II, que estão em museus de Londres, da máscara do príncipe Kanefer e estátuas retiradas de pirâmides, que se encontram nos Estados Unidos, do Zodíaco de Dendera, que está no Louvre, na França e do busto de Neférfiti, no Museu Neues, na Alemanha. Apesar disso, os países ainda não avançaram nas negociações envolvendo essas peças específicas.
Howard Carter, homenageado pela ferramenta doodle do Google, completaria 138 anos nesta quarta. Sua principal descoberta aconteceu em 1922, quando encontrou o túmulo de Tutancâmon, o mais preservado já encontrado è época. A maioria dos objetos catálogados pelo britânico foi levada nos anos seguintes à Europa e aos Estados Unidos.


segunda-feira, 7 de maio de 2012

O avanço da tecnologia promove revoluções nas formas do ser humano lidar com o meio ambiente, ao mesmo tempo que esses avanços podem levar a tragédias, no momento que o inesperado acontece.  Falhas mecânicas, erros humanos fazem parte das tentativas para o aprimoramento das técnicas e conhecimentos. Infelizmente, muitas vezes, centenas ou milhares de pessoas pagam um preço um tanto alto! No texto abaixo, dois exemplos de histórias com finais nada felizes, mas que trouxeram contribuições para os meios de transporte no mundo atual. 

Uma triste história de fogo e gelo

Publicado em 07/05/2012

O naufrágio do Titanic – o senhor dos mares – e a explosão do Hindenburg – o rei dos céus – completam datas históricas em 2012 e lembram ao mundo como tragédias podem mudar a evolução da tecnologia.

Uma triste história de fogo e gelo
O desastre parece estar na natureza dos Titanics: no mar, acabou nas geladas águas do Atlântico; no ar, explodiu em chamas. Os episódios mudaram a história do transporte mundial. (imagem: foto da Marinha dos Estados Unidos / gravura de Willy Stöwer, 1912)
Conforme o conhecimento do homem progride, o mundo parece tornar-se 'menor', em grande parte devido a novos e mais rápidos meios de transporte. O ano de 2012 é marcante para duas tragédias que ajudaram a redefinir os rumos dessa história: em 1912, Jack, Rose e mais 2.238 pessoas naufragavam com o Titanic nas águas geladas do Atlântico. Um quarto de século depois, em 6 de maio de 1937, as chamas consumiram o gigantesco zepelim alemão LZ 129 Hindenburg, o Titanic do céu, pouco antes de seu pouso, nos Estados Unidos.
Uma exposição promovida pelo National Postal Museum, nos Estados Unidos, relembra os detalhes das duas tragédias. No acervo, um mapa inédito, encontrado recentemente, mostra a rota traçada pelo dirigível, orgulho da Alemanha nazista. Além do mapa, a mostra apresenta cartas trazidas pelo zepelim – a atividade de correio pagava grande parte da despesa das viagens.

Confira o vídeo que apresenta detalhes sobre a descoberta do novo mapa e sobre a tragédia do Hindenburg


Numa época em que os aviões ainda não tinham autonomia para cruzar o oceano, os dirigíveis eram os reis dos céus. No Brasil, inclusive, foi construída a primeira base da América Latina capaz de receber as aeronaves, no Recife. Porém, a tragédia do Hindenburg, que matou 36 pessoas, acabou com esse prestígio – já abalado após as inúmeras mortes relacionadas com o uso de dirigíveis na primeira grande guerra. Depois dela, rapidamente os gigantes voadores deixariam de dominar os ares. 
O episódio é tão famoso que chegou a ilustrar a capa do álbum de estreia da banda Led Zeppelin. O nome do grupo tem tudo a ver com dirigíveis: é uma corruptela criada após Keith Moon, baterista do The Who, afirmar que a banda afundaria como um balão de chumbo (lead zeppelin, em inglês). Apesar de tão 'explosivo' como as máquinas voadoras, o Led Zeppelin acabou tendo uma vida bem mais longa que o Hindenburg. 
Capa Led Zeppelin
A capa do primeiro disco da banda inglesa Led Zeppelin exibe a clássica foto do Hindenburg em chamas. O acidente enterrou de vez o prestígio dos dirigíveis.

A patrulha do norte

Um quarto de século antes, no dia 15 de abril de 1912, foi o Titanic, senhor dos mares, que conheceu seu fim. Com o centésimo aniversário da tragédia, os destroços submersos passaram a ser protegidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O objetivo é impedir a pilhagem e a dispersão dos restos do transatlântico.
Porém, um estudo divulgado recentemente mostra que, em pouco tempo, pode não haver muito o que proteger: bactérias estão devorando as 50 mil toneladas de metal submerso, inclusive uma espécie inédita, Halomonas titanicae
Titanic submerso
Após completar um século submerso nas águas geladas do Atlântico Norte, os destroços do Titanic estão agora sob a proteção da Unesco. (foto: NOAA/Institute for Exploration/University of Rhode Island)
Ao contrário do Hindenburg, a tragédia com o Titanic não acabou com os transatlânticos, apesar de ter deixado 1.514 mortos, bem mais do que o dirigível. Ao invés disso, ajudou a redefinir seus padrões de segurança. Em 1914, entrou em vigor a Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida no Mar (Solas), que estipulava normas de segurança obrigatórias para as embarcações. Logo após o naufrágio, também foi criada a Patrulha Internacional do Gelo (IIP) para vigiar o Atlântico Norte contra icebergs.
A iniciativa já se propôs a pintar os gigantes blocos de gelo, fixar neles radioemissores e até bombardeá-los, sem muito sucesso. Hoje, atua na prevenção e no alerta, compilando dados de satélites, aviões radares e navios que cruzam a área. O perigo ainda existe, mas segundo o IIP desde janeiro de 1959 não é registrado nenhum acidente mortal envolvendo um iceberg.
Marcelo Garcia

terça-feira, 1 de maio de 2012

1º de maio: comemorar ou protestar?


O dia 1º de maio congrega diferentes formas de pensar o trabalho e comemorar este dia. Trabalhar é uma necessidade humana, mas com o desenvolvimento do capitalismo e do consumismo, o trabalho se tornou uma forma de fazer a roda do consumo girar, com o endividamento constante do trabalhador e o enriquecimento do patrão ou burguês. Karl Marx e Engels já apontavam esta problemática em meados do século XIX e chegamos ao século XXI neste processo de luta por direitos, ao mesmo tempo que somos engolidos pela máquina capitalista. Festejar é preciso, sem dúvida, mas continuar lutando para a manutenção dos direitos e a legitimação de outros é fundamental para nossa vida. Relembrando Marx e Engels, neste maio de 2012, "proletários de todo o mundo, uni-vos!"


Por trás de uma luta

No 1° de maio, pesquisadora da RHBN faz uma reflexão sobre o que é ser trabalhador nos dias de hoje e quais são os dilemas históricos que permeiam o cotidiano da classe

Nashla Dahas                                                                                            30/4/2012


Oficializado por Getúlio Vargas na década de 1940, o Dia do Trabalhador é um momento de reflexão sobre a trajetória das lutas sociais por melhores condições de trabalho ao longo dos anos. A data ganhou esta conotação ainda no fim do século XIX, após uma greve geral que terminou em tragédia em Chicago (EUA), como relata o texto Quanto vale um feriado, de Bernardo Kocher. Mas, de lá para cá, muita coisa mudou. Abaixo, o artigo de Nashla Dahas, pesquisadora da RHBN, encontra na Revolução Francesa as raízes do significado do que é ser um trabalhador hoje, além de trazer à tona uma discussão histórica por trás da realidade atual.
  •  Gravura de 1886 foi a imagem mais reproduzida do incidente em Chicago, onde aconteceu um protesto de trabalhadores que acabou confrontos
    Começo por cumprir um dever de consciência e aviso que esta discussão não é de minha especialidade, mas sim de minha convivência. Resulta da convicção de que existem modos de pensar, incluindo boa parte da reflexão histórica, que só funcionam realmente sob a forma de uma empatia ética, da capacidade humana de relacionar afetivamente representação e experiência. Iniciemos por inquietações bastante atuais: o que é ser um trabalhador nos dias de hoje? Quais dilemas históricos pautam, conscientemente ou não, a conduta diária do trabalhador neste país?
    Escrever sobre o mundo do trabalho no Brasil implica, sem dúvida, assumir um compromisso forte com a contextualização de ideias surgidas no passado, tais como os ideais de revolução e cidadania. Sob o risco de confundi-la com a história do povo, certamente vai se tratar de uma história dos vencidos, ainda que isso não signifique a omissão das muitas conquistas, e sim a muito recente alcançada autonomia da narrativa.
    Ao mesmo tempo, é necessário buscar um olhar aberto e atento à cena política contemporânea nacional e global, na qual o trabalho e o divertimento disputam as preocupações do homem comum.

    Raízes na Revolução Francesa
    Em 1789, surgiram os Direitos do Homem como corolários de uma divisão social característica do mundo moderno. Distinguindo cidadãos de cidadãos ativos, ofereceu-se somente a estes últimos o direito de escolher os legisladores e de receber mandato do povo, e ainda, para alcançar esta categoria era preciso ser do sexo masculino e ter renda mínima. Em nome da razão e tendo como direitos básicos a liberdade e a igualdade, a Revolução Francesa consagrou a destruição da antiga sociedade absolutista e deu origem a uma imensa tensão entre ricos e pobres, burguesia e povo: a própria rigidez das divisões e denominações da época reflete uma realidade social tomada pelas ideias e paixões políticas.

    Imagem de comemoração do 1º de maio em Portugal
    Imagem de comemoração do 1º de maio em Portugal
    Ainda que, ao fim e ao cabo, a luta contra os privilégios aristocráticos não tenha impedido o surgimento de maliciosos privilégios da burguesia, as ideias de cidadania e de soberania popular, assim como a violência daqueles acontecimentos atestaram a importância e a força desestabilizadora da política como prática pública, no espaço público e como expressão própria da liberdade humana.

    Contudo, se a liberdade virou liberalismo e a fraternidade foi, aos poucos, abandonada pelo discurso político, a apaixonante busca por igualdade social pautou, em tempos nem tão antigos assim, a agenda de grupos e movimentos de trabalhadores que assumiram a questão como uma razão de vida, ou uma causa de luta. Talvez isso explique parte da frequente confusão entre história, ideologia, e política no Brasil.

    Fortalecimento do movimento operário
    O fato é que nas décadas de 1920 e 30, a Revolução Russa (1917) contribuiu para o fortalecimento de um movimento operário que sacudiu o país com uma onda de greves pelo “fim da exploração capitalista”, e pelo sonho de construir uma nova sociedade. Pouco lembrado na memória do senso comum, e aparentemente menos em voga no meio acadêmico, parece fundamental reavivar a espontaneidade de um inexperiente operariado que enriqueceu a luta política nos trópicos com a diversidade da política do oriente cultural, ainda que nos períodos seguintes conciliação e repressão tenham se combinado no arrefecimento da mobilização.
    Em 1964, um golpe civil-militar se orgulhava de pôr fim ao comunismo no Brasil. Ao longo de 20 anos de ditadura, socialistas revolucionários, simpatizantes, reformistas, trabalhistas e os diversos matizes nos quais a esquerda da época se dividia foram exilados, perseguidos, e mesmo torturados numa tentativa de redefinir a identidade da pátria brasileira, mais sintonizada com o padrão norte-americano de economia, de vida e de trabalho.
    Poucos anos depois, em 1968, a Paris revolucionária atualizava suas raízes contestadoras e encontrava na cultura um novo e imenso campo para a atuação política. Nem guilhotina ou comícios clássicos, a reivindicação era demonstrada a partir da mudança dos hábitos, e no rompimento com tradições enraizadas como a família e a religião: “É proibido proibir”. Rebeliões estudantis, movimentos pacifistas e grupos de minorias étnicas e sociais compuseram as barricadas da reforma educacional, da liberdade de expressão e do anti-autoritarisimo. A adesão dos trabalhadores fortaleceu imensamente a reivindicação e unificou as classes e categorias profissionais diante do governo do general De Gaulle (1890-1970).

    Vitória da memória

    A juventude diplomada e a força de trabalho encontraram na crítica ao modelo social de capitalismo tecnocrático uma identidade fundamental compartilhada naquele momento por ampla parte do mundo ocidental. Ainda que De Gaulle tenha sido reeleito e, politicamente, o maio de 1968 não tenha alcançado suas principais reivindicações, a derrota no campo de batalha não impediu a vitória na memória. Ignorar a história dessa história equivaleria a esquecer de toda a vida e a força das alianças possíveis e das trajetórias percorridas.
    Não parece aleatório que o famoso AI-5 brasileiro tenha vindo em 68. O ato suspendeu o direito de habeas-corpus para crimes políticos, fechou o Congresso Nacional e outros legislativos, cassou mandatos eletivos, e legitimou a suspensão por dez anos dos direitos políticos de qualquer cidadão. E no bojo desses acontecimentos chegamos aos anos de 1970 e 80. Décadas em que o governo militar considerou cumpridas as tarefas de modernização da economia brasileira e de limpeza política da esquerda comunista e revolucionária, e deu início a viabilização do projeto de redemocratização no país. Projeto cujo processo não foi tão simples e prático, mas esbarrou na multiplicação de movimentos sociais e no sindicalismo do ABC paulista. Surgia a autointitulada nova esquerda brasileira, crítica da radicalização política e ideológica, e da sua irmã mais velha, a revolução.
    Falida a URSS, findo o muro de Berlim e morto o ideal de revolução, aos trabalhadores coube o papel fundamental de reinventar-se politicamente. A perda da referência socializadora pelo mundo do trabalho não significa o obscurecimento de seu caráter universal, e ao contrário da sociedade cindida pela noção de classe e marcada pelo conflito entre o proletariado e burguesia, ambos passaram a produzir e disputar uma cultura política circular e reivindicativa.
    São muitos os indícios de que se abrem novos tempos para o trabalhador como sujeito político, conhecedor de realidades históricas distantes e distintas, capazes de arrancar desta época, a tendência conformista que nos ronda.